terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Fernando Sobral: A muralha de Sócrates


Maquiavel é, por estes dias, um conselheiro útil para José Sócrates. Segundo o pensador florentino, o poder justifica-se a si próprio. É por isso que Sócrates acha dispensável justificar o que quer que seja. E prefere juntar o seu partido numa câmara de eco onde só se escuta a sua voz. Sócrates já não é líder de um partido: é–o de um culto. Assim assegurou que o PS não tenha feito qualquer exercício de reflexão nos últimos anos. Especialmente sobre o que é ser de esquerda num mundo pós–socialista. O PS, com Sócrates, transformou-se num partido a quem basta ganhar eleições para se sentir confortável com a sua inexistência intelectual. Sócrates sabe isso: por isso pede às suas ovelhas que se reúnam debaixo das suas asas. Só que isso é um símbolo de fraqueza. Quem cria uma muralha com o argumento de que é necessária a defesa contra os bárbaros quer sobretudo que quem está dentro dela não fuja. A muralha de aço de Vasco Gonçalves foi agora substituída pela muralha de plasticina de José Sócrates. O PS tem, neste momento, duas alternativas: ou seguir ordeiramente o seu líder ou correr com ele. Sócrates sabe que os portugueses não gostam de líderes que não imponham a sua autoridade.
Por isso transformou o PS moldado à sua imagem. Só que o PS, assim, ficará tão desfigurado como Sócrates quando este tropeçar em todas as suas contradições. Às vezes apetece recordar o grande G. K. Chesterton: “a desvantagem dos homens que não conhecem o passado é que não conhecem o presente”. Sócrates tem essa desvantagem estrutural. Falta-lhe memória e sobra-lhe poder.

Sem comentários:

Enviar um comentário