quinta-feira, 30 de junho de 2011

ATENAS: AS TRINCHEIRAS DO SÉC. XXI

O CASO RTP

A oposição de Paulo Portas à privatização da RTP parecia mais uma tirada populista do líder “centrista” contra a fúria privatizadora de Passos Coelho. Em termos políticos dava a ideia de colocar o PSD à direita do CDS. No entanto, verifica-se agora que, o mais provável é que Portas já estivesse devidamente informado de que os privados não estão interessados no canal público de televisão porque, caso o mantivessem na situação actual, teriam prejuízo, caso fossem anuladas as presentes limitações na publicidade, isso poderia constituir uma incomportável concorrência para os restantes canais privados.
Aliás, tanto a posição de Pais do Amaral como a de Pinto Balsemão não deixa margem para dúvidas.
Para o presidente não executivo da Media Capital, empresa que detém a TVI, “a RTP deve manter o seu estatuto de televisão pública”, alegando que a “abertura do mercado televisivo irá liquidar jornais e rádio”. Para o fundador do PSD e presidente do grupo Impresa que detém, entre outros, a SIC, o “Expresso” e a “Visão”, o investimento em publicidade tem baixado muito nos últimos dez anos “e não haverá mercado para mais um operador”.
Trocando por miúdos, ficámos a perceber que, enquanto a RTP não constituir um investimento lucrativo, deve ficar nas mãos do Estado para ser suportada pelo dinheiro dos contribuintes. Nada de novo. É assim que funciona o sistema capitalista: privatizar os lucros e socializar os prejuízos.
Sobre o tema das privatizações vale a pena ler o excelente texto de Daniel Oliveira “Privatizações, CTT e RTP: uma história exemplar.

Luís Moleiro

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O BLOCO E O FUTURO

Os maus resultados eleitorais obtidos pelo Bloco de Esquerda em 5 de Junho criaram um bom pretexto para uma sanha persecutória a este partido. Certos sectores da sociedade portuguesa pretenderam fazer dos seus desejos realidade, tentando criar nos portugueses a ideia de que o BE estaria a implodir por via de uma incontrolável dissidência interna. A comunicação social é o meio por excelência para a manipulação da verdade, em especial, quando aos visados são dadas poucas hipóteses de reporem a realidade dos factos. O suplemento P2 do “Público” de hoje traz um extenso artigo de Fernando Rosas intitulado “O Bloco e o futuro No trilho da esquerda grande” onde, depois de uma longa introdução, é feita uma análise em três vertentes: resultado das eleições, situação do país e o que nos espera e a realidade do BE. Devido à extensão do texto optámos por suprimir aqui a introdução.

E as eleições?
“Tenho para mim, ao contrário de muito que já apressadamente se escreveu ou disse, que os resultados eleitorais não só do BE, mas da esquerda em geral se devem sobretudo a um vasto fenómeno de transferência de sectores importantes do voto popular para a direita. O voto do pânico, o voto do mal menor, o voto que acreditou que o regresso do emprego e do salário vinha ao cabo de um sacrifício temporário, mas redentor. O voto que penalizou as propostas alternativas ao programa da troika, aparentemente ineficazes, porque fora do arco da única solução possível, como apregoa a impressionante campanha de mistificação ideológica que nas eleições e depois delas pretende naturalizar a sobreexploração e o esbulho e impor a sujeição à estratégia da bancarrota. O ódio à governação de Sócrates fez o resto. E, no caso do Bloco, somou-se a penalização do voto útil no PS (cuja lógica se pendurou durante semanas no empate das sondagens) e até alguma abstenção.
O PCP aguentou-se, apesar de também ter perdido alguns votos. A sua tradicional inserção regional e social, mais o aparelho sindical e autárquico que a permite segurar, ou seja, a sua História de quase um século assegurou-lhe uma mais eficaz defesa do que foi ficando do seu espaço de sempre.
Não nego que certos lanços tácticos polémicos (candidatura de Alegre, moção de censura) tenham tido alguma influência negativa em sectores mais politizados do eleitorado do BE. Mas isso não explica a largueza social da transferência de votos. Os erros principais do BE terão sido, precisamente, os de sobrestimar a capacidade de indignação e protesto popular contra o programa do FMI e o de subestimar o estado de espírito de um eleitorado que tendia a acreditar no milagre regenerador do "sacrifício nacional" e não percebeu a razão pela qual o Bloco não ia conversar com a troika. Apesar da excelente campanha eleitoral que o BE levou a cabo (propositiva, concreta, realista), isso não foi suficiente para contrariar o movimento de fundo.
Bem sei que há quem goste de insistir na "pequena política" para explicar os resultados, mas no caso concreto isso pode levar a não entender a natureza da viragem operada e do novo ciclo político que ela abriu. Pela primeira vez, desde o advento da democracia, a direita controla o conjunto dos órgãos de soberania com competências na direcção do Estado: o Presidente, a Assembleia da República e o Governo. Mas há uma novidade suplementar: a maioria PSD-CDS é alargada ao PS na aceitação comum do programa de governo que lhes foi imposto pela troika. Essa larga coligação polarizada pela direita em torno da política de austeridade prepara-se para aplicar um programa de destruição económica e de agressão social sem precedentes na história da democracia portuguesa.
Ora é aí, no campo da batalha social e política que fatalmente se vai abrir, e não na intrigalhada torpe, que verdadeiramente se vai decidir o futuro próximo da esquerda e do BE.”

E o país?
“Na realidade, nenhum economista sério pode afirmar neste momento que a estratégia do acordo imposto pela troika possa permitir o pagamento das dívidas contraídas e a recuperação económica do país. Os juros impostos, os cortes no investimento público, as reduções nos salários e nas prestações sociais, a facilitação dos despedimentos, as privatizações dos sectores estratégicos, os aumentos dos preços dos bens e serviços, o agravamento dos impostos directos e indirectos e o resto que por aí vem têm um só e seguro tipo de resultados: a recessão, o agravamento do desemprego, a queda do consumo, falências em cadeia de pequenas e médias actividades. Não criando riqueza - e esse é o resultado inelutável desta estratégia de bancarrota -, o país não pode pagar a dívida. E recomeçará o ciclo infernal de novas imposições, novos esbulhos, novas e mais graves agressões sociais. Quando, daqui a um ano ou dois, se acordar para a renegociação da dívida, porque a não podemos pagar, a situação para o fazer será a pior possível. É para aí que fatalmente o Governo de direita, infelizmente com o apoio do PS, encaminha o país. A Grécia é a trágica antecipação do que aqui vai acontecer.
O que nos países da periferia europeia sob a tutela da UE e do FMI se está a passar é uma manifestação brutal e impiedosa de desforra social e de esbulho do capital sobre o trabalho. Visando, simultaneamente, a transferência maciça dos rendimentos do trabalho para o capital e a privatização a preços de saldo dos serviços públicos mais rentáveis.
Significa isto que, nas actuais circunstâncias, a linha divisória entre a esquerda e a direita passa pela atitude a tomar face às políticas de austeridade e bancarrota impostas do exterior. O que vai pôr à prova o BE e as esquerdas deste país é a capacidade de, com base em plataformas de acção comuns, se transformarem numa esquerda plural de resistência e alternativa.”

E o Bloco?
“Apesar de andar por estas lides já há alguns anos, às vezes não consigo deixar de me surpreender com o que pode ser a ferocidade e a falta de escrúpulos de uma ofensiva manipulatória. A liga dos comentadores especializados no fim à vista do BE empapou os media com o cenário de um Bloco em dramática agitação interna: a massa dos militantes clamando por uma convenção extraordinária para demitir a direcção, esta apegando-se desesperadamente ao poder e o núcleo dos fundadores em processo de divisão e abandono. Para o arraial da dissolução em curso ser completo, nem faltaram as aventuras e desventuras do Rui Tavares com os Verdes europeus.
Devo dizer, com toda a sinceridade, que pura e simplesmente nada disto corresponde à verdade. A convenção do BE realizada em Maio passado definiu por larga maioria a linha política do Bloco e elegeu uma nova mesa nacional que se estreou há poucas semanas com o balanço das eleições, o estudo do novo ciclo político e a eleição de uma nova comissão política. Ninguém na mesa pediu uma convenção extraordinária, muito menos para demitir a direcção cessante do BE. É certo que vozes soltas o fizeram nos media, mas os mesários sabiam que isso equivalia a uma espécie de golpe de mão visando mudar o essencial da orientação política e ideológica do Bloco. E essa não é a vontade largamente maioritária dos seus militantes democraticamente expressa.
Não significa isto que não se tenham pedido, assumido e debatido colectivamente responsabilidades e erros e até aberto um debate de balanço e prospectiva que, aliás, não se vai confinar ao interior da organização, mas convocará muita gente para além dela. Não significa isto também que se desconheça a necessidade de continuar o processo de renovação geracional já iniciado nos órgãos de direcção. Como referiu, e bem, o Miguel Portas em entrevista recente, essa é uma tarefa que se fará ao ritmo que garanta uma renovação sustentada e equilibrada, mas inexorável.
Não posso terminar sem cumprir o dever de desmentir um apresentador do serviço informativo da RTP2 que ontem "informava", como se de um facto real se tratasse, que dos fundadores do BE só dois (o Francisco Louçã e o Luís Fazenda) se mantinham no BE e na sua direcção. É público que não é verdade. Eu saí do Parlamento, mas fui reeleito para a mesa nacional e para a comissão política. E lá estou com muito gosto. O Miguel Portas, ao contrário, manteve-se como deputado do BE no Parlamento Europeu, mas saiu da comissão política. As razões das saídas desses cargos são públicas e nenhuma delas decorre de qualquer dissidência ou desilusão com o percurso do BE. Lamento, pois, informar que afinal não houve dilúvio.
O Bloco faz parte de uma tradição da esquerda que vem de longe e aspira a ir para mais longe ainda, como diz o poeta. Que sabe que esta luta política por mudanças de fundo é um combate prolongado. Onde naturalmente há avanços e recuos, há vitórias e derrotas. Tenho para mim que o BE que ajudei a fundar está no caminho certo e deve ter o sangue- frio e a lucidez de não se desviar dele. Se assim for, seguramente o Bloco é um partido com futuro.”

terça-feira, 28 de junho de 2011

O EXEMPLO ESCONDIDO

Uma mentira repetida até à exaustão acaba por ser tomada por verdade como se pode constatar pela acção das máquinas de propaganda de alguns partidos políticos. Por outro lado, uma verdade inquestionável, à força de ser silenciada acaba por se converter num facto inexistente.
A utilização da classe económica nas deslocações ao estrangeiro dos nossos novos governantes foi repetida até à náusea, poucos dias atrás. Mesmo depois de se saber que quando viajam em serviço, os membros do Governo não pagam bilhete na TAP, os noticiários televisivos continuaram a mencionar que, para poupar dinheiro do Estado, Passos Coelho vai voar sempre em classe económica para a Europa.
Na actual legislatura, dos 230 parlamentares em funções, apenas 60 são mulheres deputadas de todas as bancadas o que corresponde a 26% do total.
Entre os partidos com representação na AR, apenas o Bloco de Esquerda tem uma paridade de 50% entre homens e mulheres (4 membros de cada em 8 mandatos). O que mais se aproxima da Lei da paridade é o PSD que, mesmo assim, não ultrapassa 29%. Na CDU, há duas mulheres em 16 deputados…
Se bem que a lei só imponha um mínimo de um terço de mulheres nas listas de candidatos ao Parlamento, a verdade é que, se a paridade de parlamentares eleitos estivesse próxima dos 50%, isso permitiria o exercício da democracia com mais diversidade e, portanto, com maior qualidade.
Mas este tema – que é política – não é abordado pelos comentadores que pululam na nossa comunicação social porque não interessa aos grandes partidos. Alguém se lembra de ouvir algum comentário nos noticiários televisivos a realçar que o Bloco tem um grupo parlamentar paritário entre homens e mulheres? Coisa sem significado para a democracia? Certamente que não! Apenas uma virtude que não deve ser salientada num partido que, por ser muito incómodo para os maiores, deve ser desacreditado a todo o custo.

Luís Moleiro

UMA VERDADE (INCONVENIENTE) ACERCA DA ECONOMIA


EXPLICAÇÃO DE ROBERT REICH, ECONOMISTA NORTE-AMERICANO QUE FEZ PARTE DAS ADMINISTRAÇÕES FORD, CARTER E CLINTON

segunda-feira, 27 de junho de 2011

CITAÇÃO

“Da última vez que PSD e CDS se juntaram para governar, o eleitorado ficou tão satisfeito que, na primeira oportunidade que teve, deu a maioria absoluta a José Sócrates. PSD e CDS foram tão maus que fizeram Sócrates parecer excelente. Depois, Sócrates foi tão mau que fez PSD e CDS parecerem salvadores.” (Ricardo Araújo Pereira, humorista)

domingo, 26 de junho de 2011

QUESTÃO PERTINENTE

Pergunta de Ana Benavente(*) para Nuno Crato:
“Tem afirmado publicamente a sua concepção de uma Escola centrada em três pilares: exames (muitos), que servirão para avaliar alunos e professores, conteúdos disciplinares estritos e prova de entrada na profissão docente. Como garante que tais orientações trarão melhores aprendizagens para todos os jovens face aos desafios do mundo actual?”
(*) Antiga Secretária de Estado da Educação do Governo de António Guterres

“Público” (26/6/2011)

A OUTRA FACE DA DIREITA

Como é facilmente constatado, a designação dos partidos políticos em Portugal e por essa Europa fora deixou de ter significado em relação à forma como actuam na prática. Socialismo, social-democracia e trabalhismo deixou de ser sinal de esquerda para passar a ser, cedência após cedência ao neoliberalismo, uma outra face da direita. Esta temática é analisada por um militante do PS num artigo de opinião, significativamente intitulado “Viram por aí os socialistas?”, inserido na edição de hoje do “Diário de Coimbra”. Eis a parte mais importante desse artigo:

“Há praticamente 30 anos, os partidos socialistas, sociais-democratas e trabalhistas na Europa, com honrosas excepções, iniciaram um percurso perverso de cedência ao neoliberalismo. E os resultados desse caminho foram desastrosos, como se está a ver. A direita domina claramente uma Europa em crise e, exceptuando algumas vitórias eleitorais avulsas, nada mais aconteceu de bom.
As consequências são de tal forma trágicas que a esquerda já devia ter retirado lições e consequências, mas não o fez e insiste em viver como a avestruz, fingindo não ver os resultados da sua insensatez.
O Partido Socialista Europeu é uma desgraça política, responsável pela constante capitulação dos partidos, seus filiados, perante a burocracia conservadora de Bruxelas. Mas, também seduzidos pelo capitalismo financeiro. Poul Nyrup Rasmussen, seu presidente, é um homem de palha, sem capacidade, sem voz, completamente submisso às ordens que lhe chegam da Alemanha, pela voz de Martin Schulz, o porta-voz do grupo parlamentar. E Schulz é um habilidoso, que ainda vai enganando. De vez em quando, fala à esquerda e impressiona, mas a maioria das vezes age à direita, quase sempre, em silêncio. Por exemplo, é um dos responsáveis pela continuação de Durão Barroso na presidência da Comissão, embora, periodicamente, tenha afirmações de aparente crítica.
Conseguiu neutralizar alguns partidos, colocando na liderança homens tão sofríveis, como Frank-Walter Steinmer que conduziu o SPD a uma perda de influência tão grande que hoje é difícil garantir que seja de facto o partido líder da esquerda alemã. Mas há outros responsáveis, como Tony Blair, de quem me abstenho de fazer qualquer comentário, remetendo para a lúcida análise que sobre ele produziu Mário Soares, há duas semanas. Recordarei apenas que Blair influenciou o italiano Massimo D’Alema, a francesa Ségolène Royal e, para nossa desdita, uma criatura nascida em Alijó. Em 2006 escrevi que o saneamento das finanças públicas não iria provocar qualquer crescimento na economia portuguesa. Sócrates dizia exactamente o contrário. Não foi preciso esperar muito, para ver quem tinha razão. Em 2007, o défice público estava controlado e a economia portuguesa definhava. A história vai agora repetir-se com este governo de direita, a quem a incúria de Sócrates entregou o país. Quando a dívida e o défice orçamental estiverem controlados – se alguma vez chegarem a esse objectivo – também não vai acontecer nada de bom à economia portuguesa.
Sócrates dirigiu um governo de direita, obrigando agora Passos Coelho a construir um executivo que será ainda mais à direita. Os primeiros sinais estão aí. O memorando da troika e as intenções do governo são nitroglicerina pura, com fósforo a alta temperatura. Uma bomba incendiária que, se não for contrariada, queimará os resíduos da sociedade portuguesa.
O perfil do novo ministro das Finanças, publicado na revista Visão, é um susto. Ultraliberal, formado na Católica, coberto de loas por João Carlos Espada e Nogueira Leite. Odeia John Maynard Keynes e adora Milton Friedman. Monetarista puro e duro, acredita na auto-regulação dos mercados e abomina a intervenção estatal. (…)”
(Sérgio F. Borges)

sábado, 25 de junho de 2011

PURA DEMAGOGIA

A máquina da propaganda faz os primeiros ensaios.
Os membros do Governo não pagam bilhete na TAP quando viajam em serviço pelo que Passos Coelho não poupou dinheiro ao Estado.

MÁQUINA DE PROPAGANDA EM ACÇÃO?

Desde quinta-feira que a comunicação social do regime – aos vários níveis – não se cansa de propalar que “PASSOS COELHO VAI VOAR SEMPRE EM ECONÓMICA PARA A EUROPA”. Se este for o primeiro ensaio da máquina de propaganda laranja, devemos convir que não se saiu nada mal porque, a esta hora, poucos portugueses desconhecerão que “PASSOS COELHO VAI VOAR SEMPRE EM ECONÓMICA PARA A EUROPA”.
Mas, para o caso de haver concidadãos que não vejam televisão, não ouçam rádio e não leiam jornais, aqui fica a informação: “PASSOS COELHO VAI VOAR SEMPRE EM ECONÓMICA PARA A EUROPA”.
Já dá náuseas!
A cumplicidade que Sócrates criou entre o poder político e a comunicação social levou algum tempo a consolidar, até os interesses económicos compreenderem que faziam parte da espinha dorsal do “socratismo” e, como tal, deviam proteger o defunto governo PS até onde pudessem. Um exemplo sobejamente conhecido foi a questão da TVI e do seu controlo que encobriram e mentiram para beneficiar Sócrates.
Relativamente ao PSD/CDS cujo núcleo duro emana dos grandes grupos empresariais e financeiros, tudo é mais simples por motivos óbvios e históricos.
O governo PSD/CDS vai, sem sombra de dúvida, defender os interesses daqueles grupos e, como tal, tem de ser bem protegido desde o princípio. Neste aspecto, a comunicação social tem um papel determinante no controlo e formação da opinião pública.
Tudo somado significa que a oposição de esquerda anti-troika vai passar a ter – já se nota – muita dificuldade na divulgação das suas propostas porque o acesso aos meios de comunicação social vai estar ainda mais condicionado.
Como complemento deste texto, subscrevo completamente a opinião que Daniel Oliveira assina sexta-feira no blog que detém no “Expresso”.

Luís Moleiro

sexta-feira, 24 de junho de 2011

RENOVAÇÃO COM TEMPO, EM UNIDADE E COM CRIATIVIDADE

ANÁLISE AOS RESULTADOS DAS LEGISLATIVAS 2011

Nestas eleições verificou-se uma viragem claramente à direita do eleitorado, com uma vitória do PSD/CDS, a derrota do PS e de Sócrates, mantendo a CDU, na essência, a sua base de apoio. Embora conquistando mais 1 deputado (Algarve) com mais 0,06%, a CDU perdeu 6 309 votos, passando de 446 172 (7,88%) para 440 863 votos (7,94%) a nível nacional.

O Bloco de Esquerda sofreu efectivamente uma derrota, a nível nacional, nas eleições legislativas de 5 de Junho de 2011. Relativamente a 2009, passou de 9,82% para 5,19%, perdendo 269 015 votos e baixando de 16 para 8 deputados. Em 2005 tinha tido 6,35% com 364 430 votos, elegendo 8 deputados. Relativamente a 2009, perdeu 1 deputado em Braga, 1 em Coimbra, 1 em Leiria, 1 em Santarém, 1 em Setúbal, 1 no Porto e 2 em Lisboa. E conseguiu reeleger 1 deputada em Faro e outro em Aveiro conquistados em 2009 e que não havia em 2005. E reelegeu 1 deputado em Setúbal, 2 no Porto e 3 em Lisboa. O Bloco em 2005 era a 5ª força nacional, em 2009 ficou em 3ª e em 2011 voltou para 5ª força.

No distrito de Faro o BE, em 2005 era já a 3ª força, ficando a pouca distância da CDU (4ª) e do CDS (5ª). Em 2009 o Bloco reforçou-se como 3ª força, deixando bem distante o CDS (4ª) e a CDU (5ª). Em 2011, o BE passou para 5ª força (mas voltou a eleger 1 deputado), a CDU ficou em 4ª (conquistou 1 deputado) e o CDS em 3ª força, também com 1 deputado. Apesar de ter baixado para 5ª força regional, o Bloco segurou a 4ª posição em Albufeira, Lagoa, Loulé, Portimão e Tavira.
O Bloco de 2009 para 2011 perdeu 14 603 votos, passando de 15,38% para 8,16%. Relativamente a 2005, o Bloco em 2011 teve mais 1 098 votos, passando de 7,66% para 8,16%. Em 2011 a CDU ultrapassou o Bloco no Algarve em apenas 0,41% (819 votos). Enquanto a CDU subiu 1 595 votos, ou seja de 15 638 para 17 233 votos (de 7,75% para 8,57%), o Bloco desceu 14 603 votos (de 15,38% para 8,16%), ou seja, passou de 31 017 para 16 414 votos.

Os Distritos de Faro, Madeira e Açores foram os únicos que subiram em percentagem e em número de votos relativamente a 2005. Em Beja e Castelo Branco houve subidas percentuais, mas perdem em nº de votos. Relativamente a 2005 verificou-se a manutenção nos concelhos do Algarve, grosso modo. Houve subidas em percentagem em Albufeira, Aljezur (perde votos), Castro Marim (perde votos), Lagoa, Lagos, Loulé, Monchique, Olhão, Portimão, Silves, Tavira e Vila Real de Stº António. Desce em Alcoutim, Faro, S. Brás de Alportel e Vila do Bispo.

Os Concelhos mais votados BE a nível nacional foram os seguintes: 1º Marinha Grande – 9,77%; 2º Portimão – 9,63%; 3º Lagos – 9,47%; 4º Vila Real de Stº António – 9,44%; 5º Lagoa – 9,27%; 6º Olhão – 9,03%; 7º Entroncamento – 8,96%; 8º Salvaterra de Magos – 8,45%; 9º Moita – 8,44%; 10º Sines – 8,41%; 11º Faro – 8,30%.
Nos 11 melhores concelhos a nível nacional, 6 são do Algarve (5 com mais de 9%) e 1 com mais de 8% (Faro). Ainda a nível nacional, temos apenas 6 concelhos com mais de 9% e 5 concelhos acima dos 8%. Todos os outros ficaram abaixo dos 8%.

As Freguesias mais bloquistas no Algarve são as seguintes: 1º Cabanas de Tavira – 14,96%; 2º Parchal – 13,48%; 3º Alvor – 11,02%; 4º Lagos (S. Sebastião) – 10,69%; 5º Pechão – 10,66%; 6º Vila Real de Stº António – 10,44%; 7º Ferragudo – 10,31%; 8º Mexilhoeira Grande – 10,09%; 9º Estombar – 10,05%; 10º Olhão – 9,64%. Temos assim, acima dos 10%, 3 Freguesias no concelho de Lagoa, 2 em Portimão, 1 em Tavira, 1 em Lagos, 1 em Olhão e 1 em Vila Real.


Algumas reflexões para o debate

As vitórias de 2009 e o fim do “estado de graça”
No ano de 2009 o Bloco obteve 2 grandes vitórias, nomeadamente nas Europeias (passando de 1 para 3 eurodeputados), e nas legislativas, aumentando para o dobro a sua votação e alargando o grupo Parlamentar de 8 para 16 deputados.
É preciso não esquecer que 2009 foi um ano excepcional, tendo o Bloco captado muito do descontentamento que havia principalmente em muitos eleitores do PS. Em 2008 e em 2009 verificaram-se as grandes movimentações da classe docente, com centenas de milhares de professores na rua e o Bloco com o seu trabalho bem visível e mobilizador no seu seio, captou a simpatia de muitos milhares.
Por outro lado, Manuela Ferreira Leite não representava qualquer perigo para Sócrates e não havia a pressão das sondagens e do voto útil. Além disso, o Bloco ainda com 8 deputados, era visto com respeito e até com alguma simpatia pela comunicação social, não sendo ainda alvo de grandes ataques por parte do 4º poder. A partir do momento em que o Bloco subiu para 16 deputados, a situação mudou radicalmente de figura e esta força política passou a ser o alvo a abater por todas as outras forças e pelo ataque concentrado dos media (TV, jornais, comentadores, analistas). O pânico instalou-se nestes sectores e para eles seria impensável que o Bloco conseguisse ser uma força ainda maior em futuras eleições. O “estado de graça” tinha acabado. O ataque viria a seguir.

Houve ou não pressão do voto útil?
Na minha opinião houve uma forte pressão, embora não explique a derrota bloquista. A pressão do empate técnico das sondagens entre PS e PSD foi uma realidade. Muitos milhares de eleitores que antes tinham votado Bloco regressaram ao PS, assustados com a possível vitória de Passos e o seu ultraliberalismo. Outros milhares, incluindo muitos professores, votaram PSD, pois queriam ver-se livres do odiado Sócrates e das nefastas políticas educativas, em particular a famigerada avaliação de desempenho que, ainda em vigor, não passa de uma palhaçada burocrática e de uma punição da classe docente. Acima de tudo, era preciso garantir que Sócrates e o PS não venciam de novo e só o PSD se encontrava em condições de derrotar e acabar com o socratismo. O voto útil teria assim funcionado para os dois campos distintos (não digo opostos porque não são) – PS e PSD. Mas também houve deslocações de votos para a abstenção e até para o populista CDS.

A campanha do Bloco
Considero que o Bloco fez uma grande campanha nestas legislativas, mas não conseguiu fazer passar a mensagem. Sobre os eleitores imperou a chantagem do medo e de que o FMI aí vinha para ajudar e salvar este “pobre país” à beira da bancarrota. Vingou a campanha do medo de não haver dinheiro para pagar salários e pensões. O “massacre” diário na comunicação social (notícias, comentadores, analistas, Cavaco, o triunvirato troikiano PS/PSD/CDS…) acabou por dar os seus frutos. Milhares e milhares de eleitores continuam a acreditar que o FMI está em Portugal para o ajudar a sair do desastre em que se encontra.
Sobre a manipulação dos meios de comunicação, há que ter em conta os estudos do linguista norte-americano Noam Chomsky, quando afirma que “a propaganda representa para a democracia aquilo que o cassetete significa para o Estado totalitário”. E vale a pena ler “as 10 estratégias de manipulação” das elites, particularmente as estratégias da distracção, da degradação e do diferido. Nesta última o público é levado a aceitar decisões impopulares “dolorosas e necessárias”, a serem aplicadas no futuro. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Sabe-se que o público tem sempre tendência a esperar que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Outra estratégia é a de criar problemas, depois oferecer soluções. A campanha do Bloco, apesar de ter sido forte, revelou-se impotente para derrotar as manipulações comunicacionais dos poderes políticos, económicos e financeiros.

Os “erros capitais” do Bloco
Parece mais ou menos consensual – será? - que o Bloco cometeu alguns erros no último ano, como seja o apoio ao Manuel Alegre, a moção de censura, a não ida à reunião com a troika, o apoio, no Parlamento Europeu, à zona de exclusão aérea na Líbia e até a reunião com o PCP. Alguns destes erros teriam feito mais prejuízo do que outros, sendo muito difícil, senão mesmo impossível aferir os danos provocados nos eleitores do Bloco por cada uma dessas posições.
Sobre a campanha do Alegre considero que foi nefasta e prejudicial para o Bloco o facto deste candidato se ter colado ao governo e ao Sócrates – que muita gente já odiava, como os professores – abandonando toda a sua postura independente e crítico de medidas governativas impopulares, como tinha acontecido na sua 1ª campanha. Foi muito mal visto por muitos eleitores do Bloco Sócrates e outros ministros participarem na campanha do Alegre. Por outro lado, surgiu o factor Nobre, o que não se esperava, tendo muitos bloquistas dado o seu voto a este candidato. Hoje estarão completamente desenganados.
Com a derrota de Alegre, foi o Bloco o principal derrotado – esta foi a mensagem transmitida pelos comentadores e analistas políticos. O apoio do Bloco ao Alegre revestiu-se de um elevado risco político. Mas se Alegre tem passado, pelo menos à 2ª volta, é provável que os ganhos fossem substanciais.
Sobre a moção de censura considero que a mesma não foi extemporânea, mas sim inadequada na forma. Como se veio a provar, o governo virá a cair logo pouco tempo depois devido ao PEC 4. Sócrates e o seu governo mereciam ser censurados devido à sua política extremamente neo-liberal de privilegiar os poderosos e de ataque aos direitos de trabalhadores, pensionistas e jovens, com um desemprego na ordem dos 700 mil desempregados.
O problema não foi o conteúdo da censura bloquista, o problema foram alguns “erros” na forma de apresentação. E os adversários do Bloco exploraram bem estes erros de forma e não hesitaram – tudo valia para abater o Bloco. Infelizmente alguns bloquistas (alguns membros da Mesa Nacional) alinharam neste coro anti-Bloco e acabaram por “fazer o jogo” dos nossos adversários.
Sobre a não ida à reunião com a troika constata-se que muitos dos nossos eleitores ficaram zangados. Claro que o Bloco, tal como os outros partidos não foram negociar nada com o FMI, pois este vinha para impor e não para negociar. Aparentemente, teria sido preferível ir à reunião e manifestar a nossa oposição frontal às medidas draconianas da troika, apresentando publicamente as soluções alternativas por parte do Bloco. Mais uma vez, comentadores e outros adversários vão concentrar o seu ataque ao Bloco, apelidando-o de “inútil”, irresponsável”, que “não conta para nada”. Mais uma vez, alguns bloquistas, ou próximos do Bloco, alinharam nesta histeria anti-Bloco. Porque razão não foi o PCP – que também não foi à reunião – alvo de ataques da envergadura que atingiram o Bloco? Porque o Bloco era a força principal a abater. Apesar das suas explicações, o Bloco não teve poder nem capacidade para desmontar os ataques de que era alvo.
Um outro facto, que de certa maneira passou despercebido na opinião pública, foi o apoio que o Bloco deu, no Parlamento Europeu, à imposição de uma zona de exclusão aérea na Líbia, o que motivou a intervenção da NATO, que não passa do braço armado da globalização imperial e que está a praticar os horrores que se sabe neste país no norte de África. A pretexto da defesa dos direitos humanos, o que os fazedores da guerra pretendem é o petróleo da Líbia. Não é admissível que um eurodeputado (agora ex) eleito pelo Bloco vote a favor da intervenção da NATO na Líbia, ou onde quer que seja – esta posição não faz parte da matriz bloquista e muitos eleitores não gostaram disto. Fui e sou um crítico acérrimo desta posição no PE e, como tal, manifestei o meu descontentamento na Mesa Nacional, na devida altura.

A viragem à direita
Portugal virou à direita e isto não é muito diferente do que se verifica um pouco por toda a Europa. A direita ultra-liberal e o populismo avançam e implantam-se sobre as ruínas sociais deixadas pelo social – liberalismo da 3ª via, herdeiro da social – democracia e do trabalhismo. Sociais – liberais (ainda mascarados de socialistas) que apenas estão no poder em dois países europeus, mas por pouco tempo – Espanha e Grécia. O PASOK está a levar a cabo uma autêntica política terrorista social e económica contra os trabalhadores e a sociedade da Grécia. É o que faria o PS no poder em Portugal. Mas fora do poder irá dar todo o aval a essas políticas, colaborando com a ultra - coligação de direita PSD/CDS. Afinal foi este triunvirato que nos atirou para debaixo da canga do FMI.
Ainda sobre os governos do social – liberalismo (os tais herdeiros da socal-democracia), vale a pena ler o que nos diz Ignacio Ramonet, ex-director de Le Monde Diplomatique (in Carta Maior, 22/06/11): “A conversão massiva ao mercado e à globalização neoliberal, a renúncia à defesa dos pobres, do Estado de bem-estar e do sector público, a nova aliança com o capital financeiro e a banca, despojaram a social-democracia europeia dos principais traços de sua identidade. A cada dia fica mais difícil para os cidadãos distinguir entre uma política de direita e outra “de esquerda”, já que ambas respondem às exigências dos senhores financeiros do mundo. Por acaso, a suprema astúcia destes não consistiu em colocar um “socialista” na direcção do FMI com a missão de impor a seus amigos “socialistas” da Grécia, Portugal e Espanha os implacáveis planos de ajuste neoliberal?” Mais palavras para quê?

Se o Bloco não tem cometido os “erros” atrás referidos os resultados eleitorais seriam melhores? Talvez, embora seja difícil de avaliar. No entanto uma coisa parece certa: o populismo de direita está a galvanizar toda a Europa e Portugal muito dificilmente fugiria a esta onda. E as esquerdas europeias têm-se revelado impotentes para ganhar terreno e travar esta viragem. E mesmo assim, onde continua a haver uma presença significativa da esquerda alternativa é em Portugal e na Grécia.
No Bloco de Esquerda não pode haver bodes expiatórios nem ajustes de contas. Quando se ganha não se entronizam os dirigentes e quando se perde não há cabeças rolantes. O Bloco surgiu diferente e terá de continuar a ser diferente dos outros partidos.

Com o debate passar à ofensiva
O debate interno já começou e vai alargar-se. A linha está definida e o que temos pela frente é imenso. Temos perdido muito tempo com questiúnculas internas que só desgastam e nos desviam do combate central. O que é necessário é voltar a colocar o Bloco na acção, na luta, nos movimentos sociais.
Apesar da derrota eleitoral, o Bloco tem condições de vir a liderar a oposição tanto no Parlamento como na rua. Se a santa aliança FMI/UE/PSD/CDS, com o apoio do PS, declaram guerra aos trabalhadores e ao povo português, caberá ao Bloco contra-atacar e fazer-lhes frente com êxito, procurando as convergências possíveis das esquerdas, com pessoas e personalidades de outras forças políticas, com sindicalistas, com os movimentos sociais.
Continuando fiel à sua matriz fundacional, o Bloco “não espera nada do PS nem fica à espera do PCP”. Apesar das tentativas de decapitação política do Bloco que estamos a assistir, o caminho irá prosseguir em frente, sem vacilações. Corrigindo os erros e com crítica construtiva. Mas sem mudanças de cor. Recuso um Bloco que seja uma espécie de Verdes do PCP, ou uma espécie de Verdes alemães. A 1ª opção interessará ao PCP e a 2ª ao PS.

João Vasconcelos

quinta-feira, 23 de junho de 2011

O SENTIDO DO VOTO

É o insuspeito Pacheco Pereira quem afirma, de forma inequívoca que nas eleições de 5 de Junho os portugueses votaram sobretudo contra Sócrates, embora esta declaração tire uma grande parte do mérito da vitória ao PSD e ao seu líder.
Muitos dos que votaram PSD nem se deram ao trabalho de conhecer as propostas do partido, que dizem bem ao que vêm. Mas, quando chegar a hora de pagarmos a factura, não tenhamos ilusões de que os portugueses não vão querer pagar a saúde, as portagens ou o ensino nem aceitar o encerramento de centros médicos públicos ou unidades hospitalares.
Num texto que assina na penúltima edição da revista “Sábado”, Pacheco Pereira adverte que não devemos pensar “que os eleitores votaram explicitamente no programa eleitoral do PSD como escolha substantiva, como algo que desejem ver cumprido, como algo para que se mobilizem. Não, os portugueses votaram contra Sócrates e só tocaram na questão do programa quando ela era instrumental contra Sócrates. Por exemplo, aceitaram a troika porque entendiam que mais valia um governo de fora capaz do que um governo de dentro incapaz, e a similitude de medidas entre o Memorando e o PSD favorece a legitimação deste último. Mas ilude-se quem pensa que os portugueses acham normal pagar a saúde ou o ensino, pagar portagens ou ter de andar 30 quilómetros para ter um médico, ou que vão aceitar pagar os preços reais dos transportes. Nisso não votaram certamente. E é o que vão ter.
E, depois, há que não confundir entre o que os portugueses acham que é o Estado “gordo” e o que o PSD acha que é. Uma vaga de antiestatismo percorreu, e percorre, a sociedade portuguesa. Mas esse antiestatismo não é liberal, é populista. Olha para o Estado e vê administradores, assessores, carros do Estado, regalias, prebendas e alguns funcionários públicos com o emprego garantido e que “não fazem nenhum”. Uma perigosa confusão – muitas vezes deliberada, pelo seu retorno eleitoral – foi feita entre a redução do peso do Estado e a luta contra os privilégios e abusos.”
Sabendo-se que existe um consenso generalizado sobre a orientação de voto dos eleitores em 5 de Junho, é bem provável que ela constitua, juntamente com outros erros, uma das causas dos fracos resultados obtidos pelo Bloco. Por isso, é bom que não sejam tomadas decisões a quente nem apontados culpados, de forma precipitada, dentro do partido.

Luís Moleiro

quarta-feira, 22 de junho de 2011

CITAÇÃO

“Reduções salariais e cortes a eito nos direitos são um tipo de medicina medieval que equivalem às sanguessugas receitadas pelos médicos no séc. XVI.” (João Cravinho, director do Banco Europeu para a Reconstrução)

À ATENÇÃO DOS PROFESSORES E NÃO SÓ!

Passos e Crato: factos e expectativas
Por Santana Castilho
Sobre o que já foi dito a propósito da parte conhecida do novo Governo pouco se poderá acrescentar. Impera a ortodoxia financeira do Banco Central Europeu, coadjuvada pela tecnocracia operacional do FMI. Três economistas (Victor Gaspar, Álvaro Santos Pereira e Nuno Crato) e um gestor (Paulo Macedo) fazem a quadratura do cerco. Se Paulo Macedo mandar rezar missa no fim, é porque o Bom Escuteiro acertou nas segundas escolhas.
A competência técnica abunda, ainda que deslocada de campo, nalguns casos. Mas um Governo que se limite a uma corporação de técnicos competentes não governa. É governado. Na segunda-feira passada, Assunção Cristas fez curiosas declarações na Assembleia da República. Disse que, quando chegou ao Parlamento, sabia menos de áreas onde produziu trabalho do que hoje sabe de agricultura, de que, reconheceu, sabe muito pouco. Não disse o que sabia ou seria capaz de aprender sobre o ambiente. Mas a sinceridade, o voluntarismo e o progresso contextual ficaram documentados. Só tenho pena da Agricultura.
Paulo Macedo fez um trabalho notável como director-geral dos impostos. Na altura, condicionou a aceitação do cargo à percepção de vencimento igual ao que auferia no BCP. Agora, apesar de ter subido, entretanto, na hierarquia do banco, aceitou o miserável vencimento de ministro. Causa perplexidade a mudança. E causa ainda mais ver tal pasta entregue a quem, do ramo, só tem no currículo ter sido administrador da Médis. Para a saúde dos portugueses, é muito pouco. Para a saúde dalguns, que vivem da doença dos outros, pode ser salutar.
Bem consciente do ónus de me declarar tão cedo contra a corrente, não comungo da euforia generalizada, que abriu braços à Educação. Explico o que posso explicar. Em Abril, Passos Coelho tinha um programa eleitoral para a Educação. Em Maio tornou público outro, que não só nada tinha a ver com o primeiro, como era a sua antítese. Escassos dias volvidos sobre a divulgação do último, Passos Coelho comprometeu-se publicamente a melhorá-lo. Mas faltou à palavra que empenhou e apresentou-se ao eleitorado com um programa escrito em eduquês corrente, com medidas até a 19 anos de prazo, pasme-se, e que, entre outros disparates, consagrava: a recuperação de duas carreiras no seio da classe docente; o enterro definitivo da eleição dos directores; a diminuição do peso dos professores nos conselhos gerais; o aumento da promiscuidade entre a política partidária e a gestão pedagógica do ensino; a protecção da tirania e do caciquismo; a adulteração do sentido mais nobre do estatuto da carreira docente; a consolidação dos mega-agrupamentos; a manutenção da actividade nefasta das direcções regionais; uma significativa omissão sobre concursos de professores e muitos outros aspectos incontornáveis da política educativa; a recuperação da ideia bolorenta de uma agência externa de avaliação educacional e a subserviência à corporação do ensino privado, por forma que a Constituição proíbe. Os professores, agora em êxtase, esqueceram-se disto? Eu sei que o programa de Governo ainda não é conhecido. Mas só pode resultar do que contém isto e do do CDS. E o do CDS não se opõe a isto.
Nuno Crato é um notável divulgador de ciência e um prestigiado professor de Matemática e Estatística. Em minha opinião, o merecido prestígio intelectual que a sociedade lhe outorga foi trazido a crédito incondicional como político da Educação. No mínimo, o juízo é precipitado. Permito-me sugerir que leiam a sua produção escrita sobre a matéria. Que ouçam, com atenção, e sublinho atenção, a comunicação apresentada em 2009 ao Fórum Portugal de Verdade e as intervenções no Plano Inclinado. Os diagnósticos não me afastam. Os remédios arrepiam-me. Nuno Crato é um econometrista confesso, que repetidas e documentadas vezes confunde avaliação com classificação. Nuno Crato pensa que se mede a Educação como se pesam as batatas e que muda o sistema de ensino medindo e examinando. E não mudará. Ou muda ele ou não muda nada. Fico surpreendido como os professores deixam passar com bonomia a hipótese, admitida, de contratar uma empresa privada para fazer os exames ou a intenção, declarada, de classificar os professores em função dos resultados. Estes dislates patenteiam pouco conhecimento sobre as limitações técnicas dos processos que advoga e uma visão pobremente parcial sobre o que é o ensino. Nuno Crato, que muitas vezes tem sido menos cauteloso ao apontar o indicador às ciências da Educação, tem agora o polegar da mesma mão virado para ele. Espero que não se entregue às ciências ocultas da Economia para redimir a Escola pública.
A sustentabilidade do Estado social vai pôr em causa os serviços públicos de Saúde e de Educação. No início da sua actividade, como líder do PSD, Passos Coelho trouxe esta questão à discussão política. Como é habitual, evocou a demografia: o Estado social, como o conhecemos, não suportaria a gratuidade desses serviços, numa pirâmide etária com tendência para se inverter. A necessidade de evitar a bancarrota determinou, depois, uma espécie de estado de inevitabilidade e de necessidade nacional que impede, pela urgência e pelo acenar insistente da tragédia grega, que discutamos outras vertentes possíveis de análise. Em todo o caso, teimo em duas perguntas: por que razão a acuidade do problema é menor em países com maior capacidade redistributiva da riqueza produzida? Por que razão uma economia incivilizada passa pela crise sem que a possamos pôr em causa? (Professor do ensino superior)

“Público”, 22/6/2011

terça-feira, 21 de junho de 2011

HISTÓRIA TRISTE

O triste espectáculo protagonizado por Fernando Nobre, na sua desmedida ânsia de chegar, a qualquer preço, a um lugar cimeiro da hierarquia do poder, constitui mais uma preciosa acha para a fogueira do descrédito da chamada classe política. Também o PSD borrou a opa com a cobertura que deu a tão lamentável contributo.
Ao desconsiderar, ainda há poucos meses, os legítimos representantes do povo português na Assembleia da República, Fernando Nobre teve agora a resposta que merecia da parte do Parlamento. Para além da derrota, sofreu uma humilhação sem precedentes. E bem a mereceu! Fica na história e, mais do que isso, servirá de exemplo para outros demagogos populistas que lhe queiram seguir as pisadas.
O comentário a esta “história com final infeliz” que o escritor Manuel António Pina hoje publica no JN é digno de ser lido, até pela fina ironia que o atravessa.

Luís Moleiro

segunda-feira, 20 de junho de 2011

ESTADO SOCIAL EM PERIGO

A defesa do Estado Social está na ordem do dia quando a direita pura e dura chega ao poder e tem as costas quentes pelas medidas impostas pela troika estrangeira. Os grandes beneficiários daquelas medidas vão ser os grandes grupos empresariais que já começaram a salivar perante a perspectiva de virem a abocanhar sectores tão apetecíveis como a saúde, a educação e a segurança social. A nossa direita extremista esfrega as mãos de contente porque vai ter um bom pretexto para aplicar as suas políticas com a desculpa de que foram impostas de fora.
O texto seguinte (edição impressa do “Público” de hoje) contesta muito claramente a já gasta argumentação liberal contrária à universalidade do Estado Social. É longo mas vale a pena ler

Estamos todos no mesmo barco?
“A historiadora Maria de Fátima Bonifácio (M.F.B.) decidiu partilhar com os leitores do PÚBLICO a sua estupefacção com o ideal, nunca integralmente instituído no nosso país, da universalidade, esteio de um Estado social robusto (PÚBLICO 5/6/2011). Trata-se de um ideal imparcial e distinto: todos os membros de uma comunidade política, independentemente da sua condição social, devem poder aceder gratuitamente a bens e serviços públicos financiados por impostos tendencialmente progressivos. M.F.B. decidiu também partilhar o seu preconceito, declarando nunca ter visto um argumento robusto para uma situação que considerou um exemplo de injustiça social, remetendo os leitores para as figuras da sua empregada doméstica e de Amorim, lado a lado num hospital, sem discriminações pecuniárias. Onde é que já se viu?
Dispomos de argumentos de economia moral, referentes à justeza de tal arranjo, e de economia política, referentes às condições para a sua sustentabilidade, que permitem contrariar o seu cepticismo.
Em primeiro lugar, o ideal da universalidade está na base dos estados sociais com maior capacidade redistributiva e com maior qualidade dos serviços, onde é maior a confiança social, porque são menores as desigualdades económicas e, logo, mais elevada a legitimidade dos arranjos sociais. É fácil perceber porquê: a universalidade é o meio mais eficaz para podermos dizer com algum realismo que estamos todos no mesmo barco, que temos, enquanto comunidade, bens partilhados. Desta forma, aumenta a "moralidade fiscal", a disponibilidade para pagar impostos progressivos mais elevados e para taxar os rendimentos do capital, sobretudo o que não tem aplicações produtivas, cuja importância tem aumentado. A probabilidade de fuga dos serviços públicos por parte dos grupos mais instruídos diminui e, logo, a pressão para o aumento da sua qualidade mantém-se. O acesso universal diminui os custos administrativos, pois economiza em controlos burocráticos desnecessários para criar barreiras contraproducentes. Diminui também a probabilidade de guetização dos mais pobres, condenados, em alternativa, a programas medíocres e subfinanciados, e dos que têm algumas posses, condenados a ficar na dependência de grupos financeiros cujo poder aumenta na proporção da vulnerabilidade das pessoas, resultando em transacções de mercado sistematicamente desiguais. A saúde é tão atractiva para os grupos financeiros, para as seguradoras, porque é muita a vulnerabilidade a explorar nas letras miúdas dos contratos. O recurso ao crédito para a educação é também uma área onde a vulnerabilidade dos estudantes e suas famílias é o outro lado de ganhos seguros para grupos predadores.
Em segundo lugar, temos a questão da sustentabilidade do Estado social, que tanto preocupa M.F.B. A famosa questão demográfica é menos importante do que o medíocre regime económico em que vivemos, com ganhos de produtividade reduzidos devido à fraca qualidade do capital e do investimento, oscilando entre a estagnação e a crise, com muito desemprego e precariedade, que impedem os mais jovens de planear a vida. Um regime que emergiu no final dos anos setenta com a vitória política da ideologia liberal que intelectuais como M.F.B. ainda hoje professam. De facto, a liberalização financeira, a desregulamentação das relações laborais ou as maciças privatizações criaram uma economia que é incompatível com o Estado social. Uma economia com traços claros: (1) intensificação da instabilidade financeira traduzida na multiplicação de crises financeiras, ou seja, de crises bancárias e/ou cambiais, cujo número triplicou quando comparamos com os "trinta gloriosos anos" do pós-guerra marcados pelo controlo estrito da finança;
(2) quebra do peso dos salários no rendimento nacional, declínio da actividade sindical e crise de uma economia europeia onde o salário continua a ser a maior fonte de procura e de crescimento económico;
(3) divórcio entre os lucros dos grandes grupos, em franca recuperação, e o investimento produtivo, em declínio;
(4) aumento dos lucros distribuídos, sob a forma de dividendos, a accionistas cada vez mais poderosos e impacientes, aliados a gestores de topo igualmente gananciosos e cada vez menos taxados.
Se queremos cuidar da universalidade do Estado social é esta economia, cada vez menos civilizada, que temos de reformar, combatendo a austeridade recessiva e reforçando o controlo público do sistema financeiro, que se prepara para receber ajudas que podem bem chegar a 27 por cento do PIB nacional e que se prepara para reforçar a expansão, à custa de todos, em áreas como a saúde. Só um sistema financeiro com rédea curta, ao serviço do investimento produtivo, permitirá recriar economias mistas com prosperidade partilhada.
Só com transparência democrática, com mobilização e participação dos cidadãos, é possível distinguir a despesa pública improdutiva, que resulta da promiscuidade com grupos económicos privados, da despesa que corresponde ao investimento que o Estado social faz na provisão pública, ou seja, em todos nós. A verdadeira solidariedade, que também tem de ter escala europeia, passa por aqui. Estamos todos no mesmo barco.”
(João Rodrigues, Economista, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, co-autor do blogue de economia política Ladrões de Bicicletas)

domingo, 19 de junho de 2011

CEGUEIRA NEOLIBERAL

“O pior da crise actual não são as desgraças que já provocou. Pior é a cegueira de quem não quer ver a falência do capitalismo financeiro e desregulado, de raiz anglo-saxónica, com sede em Wall Street e na City de Londres e ramificações nas principais praças financeiras do mundo. Importa fazer objecção de consciência à economia de jogos financeiros e promover uma economia orientada para a construção do bem comum.” (Frei Bento Domingues, Público, 19/6/2011)

“Promover uma economia orientada para a construção do bem comum” constitui uma ideia socialista no verdadeiro sentido da palavra. E é muito importante que seja feita por uma pessoa ligada a um meio tão conservador como é a igreja católica. Frei Bento condena inequivocamente o capitalismo financeiro desregulado como factor determinante das desgraças que actualmente abalam o mundo. A cegueira da ganância, se não for travada, também vai arrastar para o abismo a minoria que se imagina beneficiária da concentração da riqueza que se está a verificar.

sábado, 18 de junho de 2011

RECORDANDO SARAMAGO, MAIS ACTUAL QUE NUNCA

"PIGS" EMPURRADOS PARA FORA DO EURO?

A Grécia pode ser o primeiro país dos chamados PIGS a colapsar.
Tudo se está a compor no sentido do pior cenário possível, tal como as vozes mais conhecedoras, mais conscientes, mais sérias e menos comprometidas com a doutrina neoliberal vêm avisando, desde há algum tempo. Depois de sugarem o mais possível os países em situação financeira difícil, os seus credores vão pressioná-los a deixar a moeda única.
A propósito, nos últimos dias, tem sido muito citado um artigo publicado no Financial Times pelo economista Nouriel Roubini que previu a crise de 2008. Ele considera que os países periféricos, onde se inclui Portugal, devem deixar a moeda única nos próximos cinco anos. “Se o euro não vai cair drasticamente, se a redução dos custos unitários de trabalho leva muito tempo para restaurara a competitividade e crescimento e se a deflação é inviável ou (se obtida) autodestrutiva, há apenas uma outra forma para os PIGS – Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha – restaurarem a competitividade e o crescimento: saírem da Zona Euro” pode ler-se no referido artigo. Trata-se de um cenário que “parece inconcebível nos dias que correm mesmo em Atenas ou Lisboa. Mas devido à inexistência de reformas estruturais profundas e aceleradas que compensem essas diferenças, os cenários que hoje parecem irreais poderão fazer todo o sentido daqui a cinco anos” acrescentou Roubini.

Luís Moleiro

sexta-feira, 17 de junho de 2011

SÓCRATES? NÃO, PARA SEMPRE!

Portugal conseguiu correr com Sócrates mas por um preço bem alto para a esquerda. Recordando uma expressão de Vasco Santana devemos dizer em coro: “vai e, quando lá chegares, manda saudades, que é coisa que cá não deixas.”
Muitos militantes do PS devem ter suspirado de alívio na noite de 5 de Junho, na esperança de que uma nova liderança faça esquecer os portugueses o lamaçal em que Sócrates nos meteu. Por isso, soa a falso, é quase anedótico, que “socialistas” refiram a “grandeza” e “dignidade” reveladas pelo ainda Primeiro-Ministro quando assumiu todas as responsabilidades pela derrota eleitoral e apresentou a sua demissão do cargo que ocupa no partido sabendo-se que não tinha outra saída. O seguinte excerto de um artigo de opinião de um militante do PS (André Oliveira) hoje inserido no “Diário de Coimbra” é mais um exemplo do que acabámos de afirmar:
(…) “José Sócrates é o exemplo mais paradigmático de determinação, de coragem e de resistência que a história da democracia portuguesa conheceu. É de elementar justiça referir a grandeza e dignidade do seu discurso ao assumir todas as responsabilidades da derrota eleitoral, salientando que o PS soube, sempre, nos momentos difíceis identificar e pugnar pelo interesse nacional. Com grande dignidade, firmeza e serenidade chamou a si a responsabilidade da derrota. Reafirmo, parafraseando o que escrevi em crónica anterior, que os políticos que não assumem riscos não são estadistas e a história, normalmente, faz justiça aos políticos disponíveis para assumi-los, mesmo que possam perder eleições. José Sócrates correu riscos e, por isso, foi estadista. Acredito que, mesmo tendo perdido as eleições, a história se encarregará de lhe fazer justiça.” (…)
Afirmações deste jaez só ficam mal a quem as faz, em mais uma requentada tentativa de atirar areia aos olhos dos portugueses perante uma realidade tão evidente. Chamar “estadista” a Sócrates é retirar todo o estatuto àquela palavra, deturpar o seu significado.

Luís Moleiro

quinta-feira, 16 de junho de 2011

EURODEPUTADA DO BLOCO EM ALTA

Marisa Matias é a autora da nova directiva-quadro da UE sobre medicamentos falsificados. A sua proposta foi aprovada por unanimidade.

CITAÇÃO

“O problema não é do povo. O problema é desta economia de casino e das novas casas de alterne chamadas off-shore.” (António Arnaut, criador do Serviço Nacional de Saúde)

PAULO PORTAS TAMBÉM MENTIU

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Paulo Portas mentiu descaradamente enquanto Ministro da Defesa Nacional de anterior governo quando garantiu ter visto provas insofismáveis de que Saddam Hussein possuía armas de destruição maciça. Não viu porque elas nunca existiram. Enganou deliberadamente os portugueses e o seu depoimento também contribuiu para legitimar a intervenção militar dos Estados Unidos no Iraque, onde desencadeou uma guerra de agressão que já provocou centenas de milhares de vítimas, para garantir o controlo do petróleo daquele país.
Terá sido pelo frete que fez ao amigo americano que Paulo Portas foi medalhado por Rumsfeld? Nunca ficou esclarecida, em absoluto, a atribuição da medalha por aquele governante norte-americano. Terá sido apenas por uma razão ou haverá mais?... Se calhar nunca se chegará a saber.
O que ficámos a saber há poucos dias é que o brigadeiro Pezarat Correia, capitão de Abril, viu um artigo de opinião ser recusado pelo “Diário de Notícias”. Nesse texto, aquele militar do exército acusa Paulo Portas de ter mentido aos portugueses, “com dolo”, envolvendo, desse modo, Portugal numa “guerra perversa” “que se traduziu num desastre estratégico”. Que mão invisível terá impedido a publicação daquele texto? Em ditadura tal acção é designada por censura. E em democracia?
Quem já viu textos de opinião recusados sabe bem que são situações muito mais vulgares do que se pode imaginar. E com justificações pouco convincentes na maior parte das vezes. Quando envolvem cidadãos anónimos, essas acções nunca chegam ao conhecimento público.

Luís Moleiro

quarta-feira, 15 de junho de 2011

MOÇAMBIQUE: 200 MIL CRIANÇAS AO ABANDONO

A UNICEF (agência das Nações Unidas que visa, basicamente, promover a defesa dos direitos das crianças em todo o mundo) denunciou ontem em Moçambique que cerca de 200 mil crianças daquele país vivem sem os cuidados de adulto, da família ou não, incluindo as que estão na rua. Este alerta foi lançado a propósito do Dia da Criança Africana que se comemora amanhã, uma data que a UNICEF considera ser “uma oportunidade quer para a celebração quer para a reflexão”.

terça-feira, 14 de junho de 2011

EFEMÉRIDE

NO DIA 14 DE JUNHO DE 1928 NASCE EM ROSÁRIO ERNESTO CHE GUEVARA

PARA MAIS TARDE RECORDAR

Nem todos os militantes do PS se vergaram aos ditames do chefe todo-poderoso que parecia possuir olhos e ouvidos em todo o lado para tudo controlar.
Honra seja feita aos que tiveram a coragem de chamar os bois pelos nomes quando as evidências não deixavam quaisquer dúvidas. Não é, certamente, o caso dos actuais dois candidatos à liderança do partido que sempre foram aceitando, sem protestos visíveis, todas as asneiras, perseguições e malfeitorias que Sócrates perpetrou ao longo do seu consulado.
Os resultados verificados no dia 5 de Junho revelam, sobretudo, que o povo português quis ver-se livre de um aprendiz de ditador que os militantes do PS não foram capazes ou não quiseram expulsar. Só assim se explica a opção dos portugueses por uma liderança com tão poucas garantias de qualidade.
De qualquer maneira, devemos estar precavidos em relação a um regresso de Sócrates depois de uns anos de travessia do deserto. A memória, por vezes curta, dos povos dá-lhe a esperança de, quem sabe, vir a candidatar-se às próximas eleições para a presidência da República. Seria pior a emenda que o soneto…
“Retro-escopia de uma tragédia” é o título de um texto publicado na edição de domingo do “Diário de Coimbra" onde um militante do PS, crítico de sempre do reinado socratista, não deixa margem para dúvidas sobre o saldo dos últimos seis anos de Governo e do papel do seu principal protagonista.
Eis alguns excertos desse texto que devem ser guardados para memória futura:

“José Sócrates foi à sua vida que se adivinha de eloquente prosperidade e deixou o país nas profundezas do inferno e o PS atordoado com uma das mais humilhantes derrotas da sua história. As carpideiras de serviço, de vez em quando, interrompem o pranto, para murmurar que ele saiu com ‘muita dignidade’. Não percebo que outra alternativa lhe restava” (…)

(…) “Teve uma votação inferior à de Manuela Ferreira Leite e elegeu menos oito deputados que o PSD em 2009. E muitos se recordarão como esse resultado laranja foi ridicularizado. Manuela Ferreira Leite ficou, na altura, a pouco mais de sete pontos de Sócrates. Agora, o intervalo entre PS e PSD cifrou-se em mais de 10 pontos” (…)

(…) “O saldo de Sócrates é desastroso. Em eleições gerais, ganhou uma maioria absoluta, contra o mal-aventurado Pedro Santana Lopes, e uma maioria relativa, contra a madre superiora, Manuela Ferreira Leite. Em contrapartida, perdeu duas presidenciais, na primeira volta, perdeu duas autárquicas, disfarçadas pela conquista de Lisboa, por António Costa, e perdeu umas europeias. E agora, perdeu estas legislativas por números que a História vai registar. São muitas derrotas, para duas únicas vitórias.
E o país, como ficou, depois disto? Na bancarrota, submerso por uma dívida soberana impagável, um défice incontrolado, uma economia em recessão, com milhares de falências diárias, 12 por cento de desemprego, num movimento ascendente intravável. Mas há mais: o Fundo Monetário Internacional avisou que o rendimento real dos funcionários públicos e dos pensionistas vai descer, durante os próximos seis anos, pelo menos. E vale a pena recordar que esta perda de poder de compra já acontece, há mas de quatro anos. Tudo somado, serão 10 anos a caminho da miséria” (…)

(…) “Depois de três anos a fechar centros de saúde e urgências hospitalares, quem podia a creditar na sinceridade de Sócrates, quando prometia defender o Serviço Nacional de Saúde, até à última gota de sangue? Depois de três anos a encerrar escolas, contribuindo com isso para a desertificação do interior, quem podia acreditar que ele queria mesmo defender a escola pública?” (…)
(Sérgio Ferreira Borges, jornalista)


Luís Moleiro

segunda-feira, 13 de junho de 2011

O ALERTA DOS PEPINOS

O modelo económico que nos rege está exclusivamente virado para o lucro. À escala alimentar não é excepção. Em grande parte do que comemos, quase sem darmos por isso, estamos entregues a empresas multinacionais que colocam a ganância muito à frente da saúde das populações. A verdade é que tudo isto vai sendo escondido da opinião pública sabendo-se que, muitas vezes, são as nossas vidas que correm perigo. “Episódios como a gripe suína, dioxinas nos alimentos, carnes contaminadas, embalagens tóxicas fazem parte de um enorme rol de histórias que se vão somando.”
A eliminação sistemática das pequenas produções agrícolas e industriais locais não acontecem por acaso pois são um meio de favorecer a concentração da produção em grandes empresas. Todos conhecemos as exigências que, por exemplo, estão a ser feitas aos nossos pequenos produtores de queijo artesanal que vão levar, em muitos casos, à sua extinção porque eles não têm qualquer hipótese de competir com as grandes empresas.
Se é verdade que uma contaminação pode acontecer em qualquer lado, não é menos verdade que é muito mais fácil detectá-la e eliminá-la numa pequena produção local do que numa exploração em larga escala. Para além disso, neste caso, torna-se muito mais difícil a sua denúncia pelos interesses poderosos que se encontram em jogo.
A suposta ameaça dos pepinos espanhóis pode ter vindo lançar a discussão sobre aquilo que estamos a comer, como é produzido e que escuras vantagens comporta para determinados grupos empresariais. É por isso que é muito importante reflectirmos sobre um texto de Marisa Matias, eurodeputada do BE, onde é abordado este tema muitas vezes esquecido.
A certa altura podemos ler:
“O modelo de produção agro-industrial que venceu nos últimos anos pôs-nos dependentes de pouco mais de uma mão cheia de multinacionais e a comida que consumimos torna-se cada vez mais uma ameaça à saúde e menos uma necessidade ou um prazer. O uso e abuso destas bactérias na produção, assim como de conservantes e outras variações, tem sido parte de um modelo que coloca o lucro à frente da saúde pública e que tem dado origem a novas estirpes de bactérias cujos impactos só podemos desconhecer.”
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Luís Moleiro

CITAÇÃO

“É preciso odiar muito um partido e no que ele se tornou para eleger Passos Coelho.” (Clara Ferreira Alves, jornalista)

sexta-feira, 10 de junho de 2011

SER SOCIALISTA

Como todos sabemos a designação de alguns dos principais partidos políticos portugueses não corresponde, nem de perto nem de longe, à sua actual matriz ideológica. Na melhor das hipóteses equivale ao pensamento político dos seus fundadores. Basta termos presente uma afirmação de Freitas do Amaral feita em 1974/75, recentemente recordada por uma televisão, segundo a qual o então dirigente máximo do CDS defendia publicamente a instauração de uma sociedade sem classes em Portugal.
Nos tempos que correm o CDS é um partido assumidamente de direita e não centrista, o PSD nem cheiro de social-democracia tem e o PS, que há décadas enterrou bem fundo o chamado “socialismo democrático”, incorporou na sua prática política a doutrina neoliberal, sem revelar significativas diferenças em relação aos partidos de direita. Seria interessante que os militantes do PS, digamos, até aos 40 anos, lessem o primeiro programa do partido, elaborado por volta de 1973…
Apesar de todas as alterações que o mundo sofreu nas últimas décadas, nada justifica que a prática de um partido com nome de esquerda se revele tão próxima da direita mais radical.
“Ser socialista significava maior justiça social e mais equitativa distribuição de deveres e direitos, de privilégios e sacrifícios”. O Estado Social tem, não o esqueçamos, a marca da esquerda, com especial evidência no Serviço Nacional de Saúde, na escola pública, na segurança social, enfim, na defesa dos mais desfavorecidos.
Muito a propósito vem o seguinte excerto de um excelente texto que Clara Ferreira Alves assina hoje na “Revista Única”.
“Cresci num tempo em que a palavra “público” era uma palavra estimada e respeitável. Serviço público, poder público, bem público, gestão pública, empresa pública. A política tinha os seus oportunistas, sempre terá, mas, de um modo geral, o socialismo significava três coisas. Serviço público, em primeiro lugar. A ideia básica era a de que os privados não prosseguiam o bem colectivo porque prosseguiam o lucro individual e de que ao Estado competia administrar essa colisão de interesses. Em segundo lugar, ser socialista significava maior justiça social e mais equitativa distribuição de deveres e direitos, de privilégios e sacrifícios. Em terceiro lugar, ser socialista significava uma visão cultural do mundo, significava que os chefes teriam uma competência intelectual e histórica que transcendesse o homem e a sua circunstância e autorizasse o desígnio nacional dentro de um desígnio histórico mundial. Para isto era preciso ser cosmopolita e visionário, antiprovinciano e global. Era, claro, preciso ter lido uns livros e poder sustentar a gestão política numa cultura política humanista. Um político de topo era, em primeiro lugar, alguém inteligente e com cultura. Cultura também não era uma palavra maldita.”

Luís Moleiro

Reflexões sobre a derrota do Bloco de Esquerda


Tem surgido várias explicações sobre a derrota do BE - muito radical?, muito moderado?, as duas coisas ao mesmo tempo?, pouco aberto aos movimentos sociais?, etc. Algo paradoxalmente, acho que todas essas explicações estão certas, e vou tentar explicar porquê.


Mas antes disso vou fazer dois apontamentos sobre os resultados do Bloco que têm passado despercebidos:

Em primeiro lugar, desde a fundação que o Bloco é considerado a "esquerda caviar", o partido "dos meninos de boas famílias que vão fazer manifestações", e continuam a ver-se traços disso em artigos como este da Helena Matos ou este do Pedro Tadeu (que o Luis Rainha refere aqui). Mas já alguém se deu ao trabalho de ver onde o BE teve as suas maiores votações? Marinha Grande (9,77%), Portimão (9,63%), Lagos (9,47%), Vila Real de Santo António (9,44%), Lagoa (9,27%), Olhão (9,03%)... Os as freguesias com mais votos - 14,74% em Rabo de Peixe / Ribeira Grande, 13,48% no Parchal / Lagoa (uma antiga aldeia de pescadores e operários conserveiros; actualmente consiste sobretudo numa urbanização construída por um cooperativa de habitação económica, funcionando como um "dormitório")... Apesar da tradição piscatória de várias, não são propriamente terras de "caviar" (poderá-se contra-argumentar que Portimão, Lagos e Lagoa até podem ser consideradas terras relativamente prósperas, mas a análise da votação por freguesias indica que os resultados mais altos do BE foram nas freguesias mais "proletárias").

Outro aspecto é a grande variação de resultados do BE de sitio para sitio, mesmo em localidades próximas e socialmente parecidas - qual é a grande diferença entre Baleizão (11,86%) e o resto do concelho de Beja (5,72%)? Ou mesmo entre a Mexilhoeira Grande / Portimão (10,09%) e Odiáxere / Lagos (7,22%), duas freguesias contiguas e muito parecidas? Uma possivel teoria poderia ser a existência ou não de militantes activos nas localidades com mais votos (algumas pessoas iriam votar não apenas por causa dos "políticos" que aparecem na televisão, mas também por causa do militante de base que eles conhecem pessoalmente) - é uma ideia tentadora, mas impossível de testar na prática (mesmo que se concluísse que o BE tinha mais votos nas freguesias em que tem grupos de militantes, penso que seria impossível determinar o sentido da relação causa-efeito).

Mas, agora, vamos à minha teoria sobre as causas da derrota.

Imagino 3 (ou melhor, 3 e meia) estratégias possíveis para um partido à esquerda do PS:

1 - o "verdadeiro PS": defender aquilo que nas décadas anteriores era defendido pelos partidos da Internacional Socialista no mundo ocidental, e que está actualmente a ser desmantelado, tanto pelos "socialistas" como pela direita - altos impostos sobre os ricos, subsídios aos pobres, serviços públicos gratuitos (SNS, escola pública, etc) e eventualmente uma ou duas nacionalizações. Na minha opinião, tem sido largamente esta a linha do BE

1a - uma variante desta opção é a defesa da "social-democracia mundial" (ou pelo menos europeia) contra o "Estado Social num só país": defender que numa economia integrada os mecanismo de regulamentação económica e de protecção social também têm que ser integrados, até para evitar a "corrida para o fundo". Muitas posições do BE (como a defesa da "europeização" de parte da dívida dos PIGS ou da harmonização fiscal na UE) podem enquadrar-se aqui

2 - "estatismo clássico": defender uma estatização substancial da economia. Poderá haver quem ache que o programa de 2009 do BE aproximou-se disso (embora as nacionalização lá propostas não fossem mais radicais do que partidos de centro-esquerda, como os Trabalhistas ingleses ou os Socialistas franceses, fizerem em tempos)

3 - ser o partido do "poder popular" - erguer bandeiras como a democracia participativa/directa (p.ex., o orçamento participativo), a participação dos trabalhadores na gestão da produção, a defesa de formas de economia comunitária não-capitalista e não-estatista, etc. Realmente, antes de 1989, os partidos de "extrema-esquerda" que se vieram a integrar no BE tinham, em certo grau, uma tradição de defesa do "poder popular de base" e de que esse seria o "verdadeiro socialismo", por contraponto ao socialismo burocrático da URSS e do PCP. No entanto tal posição tem estado largamente ausente da linha actual do BE

O problema da "linha 1" é que a margem para a diferenciação face ao PS acaba por ser muito estreita, correndo-se facilmente o risco de cair numa de duas situações - ou o partido aparecer como um apêndice do PS (o "caso Alegre"?), ou então, pelo contrário, em qualquer questão fazer ponto de honra em marcar a diferença face ao PS, dando a muita gente a impressão de ser um partido do "contra pelo contra" (a linha seguida após as presidenciais?). Por isso é que digo que tanto os que dizem que o BE foi muito colado ao PS como os que dizem que foi muito sectário acabam por ter razão - na minha opinião, a estratégia social-democrata e excessivamente parlamentar não é a melhor; mas, a partir do momento em que se adopta essa estratégia, a táctica mais lógica e coerente seria mesmo a da "amizade colorida" com o PS, aliando-se numa votações, divergindo noutras, mas sem o hostilizar por principio. De certa forma, parece-me que a estratégia recente do BE foi uma combinação de oportunismo estratégico e de sectarismo táctico (ou talvez isso seja o resultado de compromissos a nível da direcção, em que a busca de um equilíbrio entre várias propostas estratégicas lógicas e coerentes acaba por conduzir a uma linha errática e incoerente).

A linha 1a, se calhar até é tecnicamente correcta (pelo menos de acordo com grande parte da teoria económica convencional), mas tem o problema que não é uma proposta politica para Portugal, mas sim para a Europa (mais sobre isso mais à frente).

As linhas 2 e 3 têm o problema de qualquer proposta de romper com (em vez de fazer uns ajustes ao) sistema: a maior parte das pessoas reagem com "isso é impossível" (para a linha 3), "viu-se o que isso deu" (para a 2) e afins.

Deixando de lado a linha 2 (até porque esse nicho já está largamente ocupado), parece-me que o melhor caminho para defender a linha 3 (a tal do "poder popular", mas podem dar-lhe outro nome se não gostarem deste...) é o da "aprendizagem pela acção" - se grupos de cidadãos se mobilizarem e organizarem por uma causa especifica (e sobretudo se conseguirem ganhar a sua luta...), vão pouco a pouco adquirindo o hábito de tentarem influenciar directamente as decisões políticas, em vez de se limitarem a votar de "x" em "x" anos (x<=4).



Assim, um partido que tivesse o "poder popular" como "programa máximo" deveria seguir como estratégia principal apoiar o desenvolvimento de movimentos sociais (novos e velhos) "de base" (reconheço que há um perigo nesta estratégia - a fronteira entre "apoiar o desenvolvimento" e "telecomandar" pode ser bastante porosa).

Pelo contrário, a actividade do Bloco de Esquerda nos últimos anos tem tido o Parlamento como eixo central, e mesmo o seu funcionamento interno tem privilegiado o aspecto "partido de deputados e de eleitores" em detrimento do de "partido de militantes/aderentes/activistas". Aliás, as várias alterações organizacionais que o BE tem tido (formais e informais) tem sido no sentido de, dentro do partido, reforçar a "democracia burguesa" face à "democracia participativa" (veja-se a substituição da direcção colegial por um coordenador, o fim da rotatividade dos deputados, o reforço da Mesa Nacional face às Assembleias Distritais - plenárias - na elaboração das listas de candidatos, etc.).

Já agora, num momento de descredibilização cada vez maior da democracia representativa, é ao mesmo tempo triste e irónico ver tanto o PCP como o BE transformados nos seus maiores apologistas - nos períodos eleitorais, o mais normal é ouvir tanto comunistas como bloquistas dizendo algo como "as pessoas estão convencidas que são todos iguais; temos que as fazer compreender que não são todos iguais"; por outras palavras, "o sistema é bom, o problema são as pessoas que vocês elegem; deveriam eleger outras", uma posição que provavelmente muitos pensadores presentes nas bibliotecas das sedes dos dois partidos chamariam de "idealista". A verdade é que, se os políticos parecem ser "todos iguais", isso provavelmente significa que há algo no sistema que os faz ser "todos iguais" quando chegam ao poder, e portanto o que é preciso é mudar o sistema (por outras palavras, a melhor resposta à questão "será que se o Louçã fosse para lá faria melhor?" seria "o que é preciso é acabar com o «lá», com esse «lá» em que uns decidem a nossa vida, e criar uma nova sociedade em que as decisões sejam tomadas «cá», pelos que são afectados por elas").

Umas notas finais:
  • É possivel que a "aberração" tenham sido os resultados de 2009 - nas eleições para o PE (ideais para mandar "cartões" ao governo) o Bloco teve uma elevada votação (dos quais arrisco-me a dizer que muitos terão sido "votos de protesto"), e tal deu "embalo" para as legislativas, poucos meses depois.
Há muita gente que vota BE (e CDU) não porque os queiram no governo, mas simplesmente como uma forma de dizer ao PS "queremos que governem à esquerda"; como é evidente, este mecanismo só funciona quando essas pessoas acham que o PS vai ganhar - se acham que o PSD vai ganhar, preferirão reforçar o PS. Atenção que isto não é o famoso "voto útil" - o "voto útil" é alguém que se identifica ideologicamente com o BE ou com o PCP votar PS para travar a direita; o que estou a falar é de alguém que se identifica ideologicamente com o PS votar no BE ou na CDU para mandar um sinal à direcção do PS

quinta-feira, 9 de junho de 2011

OS POBRES, ESSES MALANDROS

A popularidade que a dra. Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar Contra a Fome (BA), goza nos meios de comunicação social do regime dava para desconfiar sobre o seu pensamento acerca do Estado Social.
A entrevista que concedeu à TSF no último domingo, veio colocar a descoberto que esta senhora defende claramente a caridadezinha em detrimento da justiça social. Em dia de eleições, as declarações da dra. Isabel Jonet passaram despercebidas mas é bom que todos estejamos alerta para o que a presidente do BA pensa sobre a condição de quem é pobre e o que considera ser o “efeito perverso” do Estado Social. Usa claros argumentos malthusianos: “Se os pobres forem apoiados na sua pobreza, tornam-se indolentes – recusam o salário e o trabalho assalariado.
Com afirmações deste teor e com a exposição mediática que está ter, não nos podemos admirar que esta responsável venha a transitar para algum cargo mais elevado…
Estamos, mais uma vez, perante a insuportável hipocrisia de uma personalidade que, dirigindo uma organização de apoio aos pobres, desconfia deles mesmo perante uma realidade tão crua como a que nos cerca.
Será que a culpa da pobreza é dos próprios pobres?
Mais de metade da população mundial passa fome. Será que toda esta gente é culpada da sua condição, sabendo-se que, na maioria dos casos não goza de qualquer apoio social?
Não tenhamos a mais pequena dúvida de que a fome, que anda de braço dado com a pobreza, tem tudo a ver com a má distribuição da riqueza. No início do séc. XXI, a produção agropecuária mundial dava para alimentar cerca de 9 mil milhões de seres humanos enquanto nessa altura a população era de pouco mais de 6 mil milhões. O problema é que as pessoas não possuem o dinheiro suficiente para suprir as suas necessidades básicas.
Em Portugal, a divulgação de ideias adversas ao Estado Social por personalidades de algum relevo na sociedade, vêm mesmo a calhar quando se pretende reduzir ao máximo o RSI, o subsídio de desemprego e toda a espécie apoios sociais aos mais pobres. Nada acontece por acaso!

Luís Moleiro

WALID EL SAYED - SOU DA GERAÇÃO DO BASTA

terça-feira, 7 de junho de 2011

CITAÇÃO

“O coro dos comentadores da direita parece querer transformar o rescaldo eleitoral num ajuste de contas raivoso com Francisco Louçã. Não se iludam. A direita quer duas coisas: silenciar o porta-voz desta esquerda subversiva e firme na denúncia da ordem estabelecida e, com isso, sonha mudar a cor do BE. Fingem não perceber que neste partido, em lutas desta envergadura, não há responsabilidades individuais. Nem nas vitórias, nem nas derrotas.” (Fernando Rosas, dirigente do BE)

segunda-feira, 6 de junho de 2011

O DIA SEGUINTE

Em cada eleição a democracia parece sair menos dignificada. A abstenção verificada ontem foi de 41,1% o que significa só que 6 em cada 10 eleitores portugueses exerceu o seu dever cívico de votar. Se, como tudo indica, for levada a cabo uma coligação PSD/CDS, isto quer dizer que apenas 25% do total de cidadãos eleitores apoia o próximo governo.
A campanha eleitoral dos partidos da nossa troika primou pela camuflagem do verdadeiro programa do governo que segue. O acordo promovido pelo FMI/BCE/EU garantia, desde logo, qualquer que fosse o resultado das eleições, um executivo à sua medida. Foi como se jogassem uma tripla no totobola.
A esmagadora maioria da comunicação social garantiu, com a sua desinformação, um caldo propício ao silenciamento do pacote imposto pela troika internacional. O tratamento das questões sérias foi boicotado pelos partidos da direita – não há dúvida que são três – e pelos seus apoiantes nos media.
Quanto aos resultados do Bloco de esquerda, não vale a pena dourar a pílula porque foram abaixo do esperado, mesmo pelas previsões mais pessimistas. Perder oito deputados não é coisa pouca quanto mais sabendo-se que isso significa uma quebra de cinquenta por cento. Se é certo que a conjuntura era desfavorável ao BE, a verdade é que não podemos esquecer erros de palmatória que foram cometidos pela direcção do partido depois dos excelentes resultados de 2009.
O primeiro erro tem a ver com a pressa no apoio a Manuel Alegre quando seria de ponderar uma outra solução que não colocasse lado a lado o partido de Sócrates e um dos seus mais directos rivais. A pressa foi má conselheira se bem que se tenha verificado que Alegre seria um candidato bem posicionado para derrotar Cavaco caso houvesse um sério empenhamento do PS. Mas não houve e o BE ficou associado a um candidato que, para além de perdedor, obteve um fraco resultado nas urnas.
O segundo erro foi quase infantil e também resultante de uma decisão tomada com inusitada pressa – a apresentação da moção de censura. Não está em causa que o Governo a não merecesse. O que se rejeita é que tenha sido uma resolução tomada em cima do joelho, com justificações mal concebidas, numa espécie de competição com o PCP para ver qual chegava primeiro. O resultado é que a máquina de propaganda do PS aproveitou este deslize para transmitir ao povo de esquerda a ideia de que o Bloco pretendia favorecer a direita. Parece que esta mensagem terá atingido os seus objectivos.
O terceiro erro também tem a ver com uma atitude mimética em relação ao PCP: a recusa de qualquer contacto com a troika. Muitos votantes e aderentes do BE não se sentiram representados perante aquela organização mesmo que fosse – assim teria de ser – para rejeitar as suas propostas. A comunicação social do regime e seus acólitos aproveitaram a situação para apelidar o Bloco de partido “inútil”, na sua missão de denegrir o papel dos que denunciam as consequências do pacote de medidas de austeridade imposto pela troika. Tratou-se de um erro estratégico já que o partido rejeitaria qualquer espécie de compromisso do tipo que foi aceite pelo trio PS/PSD/CDS. Pedia-se apenas que marcasse presença para vincar a sua posição de firmeza.
Perante os resultados obtidos e para reanimar e mobilizar as bases do partido, é de elementar bom senso a convocação de uma Convenção extraordinária. É importante que tenha lugar uma religitimação democrática dos órgãos dirigentes depois de um debate interno sobre as causas da derrota eleitoral.

Luís Moleiro

Dividocracia (Debtocracy) - Parte 1 e 2





Legislativas: A reunião extraordinária que faltava

Legislativas: A reunião extraordinária que faltava


Resultados Eleitorais 2011


Reflexão :

Um dia negro para o Bloco de Esquerda, que não conseguiu capitalizar nada com a derrota do PS e com o combate ao programa da troika. O risco de extinção é imenso

Francisco Louçã assumiu a derrota fortíssima do seu partido, que perdeu metade dos deputados e quase metade dos votos. Como é que foi possível o Bloco de Esquerda não ter capitalizado um avo da derrota dos socialistas? Isto vai ser matéria obrigatória para reuniões intensas nos próximos tempos. Desde as presidenciais que as esperanças do Bloco de Esquerda na “esquerda grande” estavam a falhar.
O sucesso do Bloco de Esquerda residiu, durante muitos anos, no factor “novidade” – e ao fim de 13 anos todas as novidades deixam de o ser. Além desse factor em si ser da máxima relevância, o Bloco assentou boa parte da sua conquista de território eleitoral em causas como o aborto, a despenalização da droga e o casamento entre homossexuais. Com o andar da carruagem, esses assuntos saíram da agenda – foram legalizados, resolvidos, consumaram-se.
Sobrou a “esquerda” – mas a última experiência de associação à esquerda correu mal. O Bloco perdeu voz nas presidenciais, quase até à afonia. Capturado pelo discurso ambíguo de Manuel Alegre (ora com o governo PS, ora menos com o governo PS), o Bloco não encontrou o seu sítio.
Ou há uma revolução interna no Bloco de Esquerda – e não se está a ver bem como, neste momento, embora nestas páginas, o sociólogo Boaventura Sousa Santos dê algumas sugestões – ou o BE corre o risco de ficar acantonado na soma do PSR mais Política XXI mais UDP. Ou seja, condenado à extinção num prazo muito breve.

A minha opinião:

O BE tem mais dificuldades, porque o seu eleitorado não se revê nas suas posições económicas. Essa capacidade do seu eleitorado de ignorar o que o BE diz sobre a economia tem-se tornado mais difícil, especialmente desde que o partido entrou em "competição directa" com o PCP. Quanto mais o Bloco se assemelha ao Die Link (pós-comunistas alemães), menos se assemelha aos Verdes. E o Bloco de Esquerda ganha mais eleitores quanto menos definido ideologicamente e mais parecido com os Verdes for. A sua aproximação ao PCP retira-lhe capacidade de atracção do eleitorado que tem alimentado o seu crescimento.


ANA DRAGO:

Ana Drago uma das mais disputadas pelos jornalistas. A novamente eleita deputada por Lisboa referiu que o partido foi derrotado e "vai fazer a reflexão colectivamente", já que "a culpa não deve ser personalizada". Sobre o líder, Ana Drago reconheceu que "não é aceitável e a culpa não deve cair sobre uma só pessoa".