segunda-feira, 30 de abril de 2012

CONTRA A INDIFERENÇA

Diga-se, em abono da verdade, que este Governo tem gozado da maior complacência dos portugueses para levar a cabo uma agenda ideológica que consagra, na prática, o regresso às condições de vida existentes antes de Abril de 1974. Também não é menos verdade que tem tido, em geral, a colaboração de uma comunicação social compreensiva perante todas as malfeitorias que, paulatinamente vão sendo levadas a cabo. E a prova disto está no rol de críticas que sofreram aqueles que estiveram ausentes das cerimónias “oficiais” do 25 de Abril deste ano. Essa ausência, todos percebemos, foi uma forma de chamar a atenção dos portugueses para o rumo errado que o país está a tomar. Mas a realidade é que se verifica uma total indiferença dos nossos concidadãos perante as agressões que estão a sofrer. O texto seguinte foi transcrito do “Diário de Coimbra” de ontem (29/4) e constitui mais uma pedra no charco dessa indiferença que nos pode conduzir ao desastre.


Passos perdido!
As comemorações do 25 de Abril, este ano, escaparam à rotina e tiveram por isso um inesperado motivo de interesse, para os jornais e para a opinião pública. Afinal, que intenção tiveram os capitães de Abril e personalidades, como Manuel Alegre, ou Mário Soares, ao faltarem à liturgia com que, oficialmente, se assinala o Dia da Liberdade?
A resposta para esta questão parece óbvia. Quiseram, sobretudo, chamar a atenção dos portugueses para a sua própria passividade, demonstrando-lhes que é preciso abanar a inércia e agir, se, por acaso, querem inverter o sentido que as coisas estão a tomar. Se mantiverem o estado de letargia que tem prevalecido, é certo que nada vai parar a fúria destruidora do Governo. Só não sei se eles, os portugueses, perceberam isso.
Há, pelo menos, duas razões que justificam esta “greve” à sessão solene. Primeiro, no ano passado, o Parlamento demitiu-se das comemorações, por estar em vésperas de abandonar funções. Com isso, os deputados abriram um precedente, sem pensarem que, num futuro tão próximo, podiam passar por este enxovalho.
Segunda explicação: este Governo – e a maioria parlamentar que o apoia – tem-se empenhado, exclusivamente, em desfazer aquilo que o 25 de Abril fez. Portanto, à partida, toda a gente sabia que a sessão de S. Bento não passaria de uma hipocondria manifestação de cinismo. Nenhum resistente se pode sentir bem a festejar o 25 de Abril ao lado de Miguel Relvas, de Vitor Gaspar, ou de Álvaro Pereira, entre muitos outros de passado duvidoso, ou mesmo frívolo, que por lá pontificam.
Claro que o primeiro-ministro reagiu insensatamente, nervoso, o que se compreende. Passos Coelho não gostou que a “greve” daquelas personalidades tivesse acontecido, porque, no estado de queda descontrolada em que está, não gosta que aconteça, seja o que for. Quer um país quieto, surdo e mudo, que não se erga para tentar travar os desmandos do Governo.
Salvo melhor opinião, o 25 de Abril fez-se para criar melhores condições de trabalho para um Povo que vivia em regime semi-esclavagista. Este Governo tem feito tudo para trazer de regresso esse regime, com salários de miséria, para horários de trabalho arbitrários.
O 25 de Abril fez-se para que todos tivessem direito ao trabalho e ao emprego, com garantias. Este Governo quer tirar da lei o reconhecimento desse direito e, explicitamente, liquidar o emprego com garantias. Este Governo quer retirar da lei o reconhecimento desse direito e, explicitamente, liquidar o emprego com garantias.
O 25 de Abril fez-se para instituir a igualdade de oportunidades para todos os portugueses. Este Governo prefere contentar opiparamente as suas insaciáveis clientelas e deixar os portugueses para o fim.
Passos Coelho está a entrar na rampa descendente, sem dar por isso. Por enquanto, sobrevive à custa de uma oposição incapaz de o confrontar com as suas próprias decisões.
Por exemplo, como fala ele em crescimento, se abdicou de investimento público e desmotivou qualquer possibilidade de investimento privado? Como pode falar em crescimento económico, quando está a executar uma política de empobrecimento dos portugueses? Como pode dizer que quer criar emprego, à custa do desemprego que está a provocar? Como quer criar emprego, consagrando na lei o despedimento arbitrário?
Tal como o seu antecessor, Pedro Passos Coelho é um embuste medonho.
Levou a austeridade muito além do exigido pela troika, para regressar aos mercados, em meados de 2013. Estamos em Abril de 2012 e a resposta está aí: juros acima dos 11%, mais do dobro do estipulado para a Espanha.
O discurso está esgotado e hoje já ninguém conhece o programa e os objectivos deste Governo. Prometeu mudar, mas está tudo cada vez mais parecido com a governação de Sócrates.
É navegar à vista, sem saber se aparece um salva-vidas, ou mais um tornado que nos faça definitivamente naufragar. A hora de Passos Coelho está a chegar.
Ele talvez não tenha percebido. Mas, para nossa salvação, era bom que o país o percebesse. (Sérgio Borges)

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