domingo, 27 de maio de 2012

A DITADURA PERFEITA

O regime político em que vivemos é aquele que melhor serve o sistema capitalista. Quase sem darmos conta, as nossas escolhas políticas estão sob permanente vigilância para se evitar que o sistema seja colocado em causa. Vamos assistindo a uma rotação dos atores políticos sem que isso signifique uma efetiva mudança de políticas. Os partidos do chamado “arco do poder” têm cada vez menos diferenças para além de pequenos pormenores, como convém… A linha seguida deve regular-se pela máxima: “alternância sem alternativa”.

As chamadas franjas “radicais” constituem uma espécie de cereja em cima do bolo que o sistema tem controlado com alguma facilidade.

Enquanto se vai mantendo o povo anestesiado, tudo corre bem (para o sistema), mas o pior é quando o povo, farto de ser enganado e espoliado diz basta! e procura outra soluções. É o que pode vir a acontecer na Grécia nas próximas eleições apesar da chantagem a que todo o povo grego tem vindo a ser sujeito, caso se pronuncie, em maioria, contra os partidos que defendem a austeridade agressiva imposta pela troika. O neoliberalismo radical joga muito forte no estado helénico com fundados receios de que seja colocada em prática uma alternativa que liberte o país das garras da degradação a que chegou. Seria um “mau” exemplo para os restantes países europeus que agora se encontram em dificuldades.

Muito melhor do que nós, Daniel Oliveira aborda este tema no excelente texto que transcrevemos do “Expresso” de ontem.


ATENIENSE E GREGO

A repetição das eleições na Grécia é, provavelmente, o mais importante acontecimento político deste ano. Os gregos votarão em quem quiserem e a sua escolha, agrade ou desagrade, será sempre legítima. Mas neste momento assistimos a um processo de chantagem que quer dizer aos gregos exactamente o oposto: se escolherem o contrário do que os seus credores, a banca e os burocratas europeus que ninguém elegeu, pagarão muito caro o seu atrevimento. Há mesmo quem se pense no direito de os ameaçar de expulsão do euro. Se a Grécia votar, como a maioria das sondagens indica, no Syriza, lançará um verdadeiro desafio à União: o projecto europeu é compatível com a democracia? E transmitirá uma poderosa mensagem aos europeus: que nem tudo são inevitabilidades.

A democracia nunca esteve garantida. E não está escrito em lado nenhum que ela só pode cair às mãos de golpes militares ou revoluções violentas. Na verdade, estamos, neste momento, na fronteira entre um passado democrático e uma ditadura perfeita. Podemos votar em quem quisermos, eleger quem quisermos, na condição de que isso seja absolutamente indiferente. Não apenas indiferente em relação a grandes escolhas ideológicas e de modelo de sociedade. Indiferente em tudo: impostos, grandes opções orçamentais, política social, privatizações. Estamos na eminência de para defender adquiridos básicos do século XX – Estado Social, escola pública, serviço nacional de saúde, soberania democrática – seremos obrigados a opções mais drásticas do que o voto.

Nunca é boa ideia definir como histórico um acontecimento demasiado próximo. Mas podemos estar a assistir, na Grécia, à última oportunidade para contrariar esta ditadura perfeita através de eleições livres e democráticas. E é isto que determinará se os europeus não serão obrigados, no futuro, a escolher entre a União Europeia e a moeda única, por um lado, e a democracia e o Estado social, por outro. Ou a Grécia mostra que há alternativas ou teremos, como em Itália, humoristas a vencer eleições. A democracia morrerá, sim. Mas ao menos ri-se da sua desgraça.

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