terça-feira, 26 de junho de 2012

RADICALISMO NEOLIBERAL

A doutrina neoliberal (na sua forma mais radical) que actualmente domina os destinos da Europa orienta-se segundo duas ideias fundamentais: 1) Beneficiar a especulação financeira em detrimento dos interesses das populações; 2) Fazer gato-sapato da democracia.

Portugal tornou-se um exemplo paradigmático da aplicação destas ideias. O respeito pela vontade das populações é atirado ao lixo logo que confirmados os resultados eleitorais. O que passa a valer é a obsessão pela vontade dos “mercados”, entidades indefinidas, nunca submetidas ao voto popular. Se os “mercados” ordenarem que se cumpram medidas férreas de austeridade ainda que milhões de pessoas passem fome e outros tantos não tenham trabalho, que importância tem isso para os “fiéis servos dos mercados de capitais”? Coisa pouca, apenas danos colaterais…

Tendo como pano de fundo este panorama e a poucos dias de uma manifestação pelo direito ao trabalho promovida pelo Movimento Sem Emprego, vale a pena ler o seguinte texto do prof. de Economia, Júlio Mota, que recolhemos do “Diário As Beiras” de hoje.



RESPONSABILIZAR BRUXELAS

Subscrevi o Manifesto do Movimento Sem Emprego.

Por mero acaso, hoje, deparo-me com um texto fabuloso sobre as políticas de austeridade na Inglaterra, na Europa, algures, assinado por um grande economista inglês, John Eatwell, hoje membro da Câmara dos Lordes, na Inglaterra e actualmente presidente do Queens’ College em Cambridge. Por este texto passa fundamentalmente o problema que vai levar milhares de jovens à rua no dia 30 de Junho. Por isso a todos eles, aos que subscreveram o manifesto, aos que ainda o não subscreveram e aos desempregados que não o subscreverão por ignorância, dedico o esforço feito com toda esta peça de reflexão sobre o momento que passa.

Um texto que com uma clareza espantosa mostra à evidência a desonestidade intelectual dos neoliberais a governar em Londres, em Lisboa, em Madrid e sobretudo em Berlim e Bruxelas. Com este texto, mostra-se à evidência o absurdo das políticas de austeridade impostas por Bruxelas e Berlim e desejadas por fiéis servos dos mercados de capitais e de um modelo de sociedade, caracterizado por um neoliberalismo puro e duro que à democracia vira as costas sistematicamente.

No documento em presença questiona-se como é que os Estados terão dinheiro para refinanciar o FMI, terão dinheiro para refinanciar a banca e não têm dinheiro para financiar o futuro do respectivo país, investindo principalmente na criação de emprego e na formação séria da sua juventude, o nosso futuro, afinal. Mais grave ainda em plena crise a contracção do investimento público a que praticamente todos os países têm sido obrigados a praticar levará a baixar o ritmo do PIB potencial no futuro, a capacidade produtiva dos dias de amanhã, com efeitos negativos a serem criados sobre as despesas, sobre os rendimentos, sobre as receitas dos respectivos Estados. Por outro lado, com o crescimento das taxas de juro já a nível usurário será a dívida também ela a crescer. Deste modo, está assim criada uma situação de efeito de bola de neve em período de crise, ou seja, em que pagamos cada vez mais e deveremos ainda cada vez mais, em que cada vez teremos menos emprego e mesmo menos produção para o poder fazer, menos possibilidade de pagar, portanto. Basta olhar para a situação portuguesa para percebermos bem o respectivo texto.

Devemos responsabilizar os responsáveis por tudo o que se está a passar e do meu ponto de vista pessoal a responsabilidade maior passa por Bruxelas que decidiu optar por servir os mercados de capitais e não as populações, não os povos europeus, não o seu projecto, e em que estes são assim apanhados numa situação de tenaz, por um lado com os mercados e a sua ganância, por outro com as autoridades europeias e os seus valetes nacionais com uma extrema vontade em os servir.

Eatwell chama a atenção para a diferença entre o final da segunda grande guerra, com os ratio da dívida pública bem superiores aos de hoje e mesmo assim homens com coragem, com o verdadeiro sentido de servirem o seu povo, reconstruiram a Europa, criaram sistemas nacionais de saúde, criaram sistemas de ensino condigno, criaram situações de reforma na velhice, tudo o que os senhores no poder andam agora apressadamente a destruir, em nome das políticas de austeridade, em nome da necessidade de pagar aos mercados o que estes lhes exigem. Se nessa altura estivessem à frente os homens como Durão Barroso, David Cameron, Rajoy, Passos Coelho, Merkle e outras figuras do mesmo calibre estaríamos possivelmente quase ao nível da barbárie, quase ao nível da idade da pedra, tal é a violência por todos eles mostrada para destruir a Europa social que levou décadas a construir.

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