terça-feira, 17 de julho de 2012

MINISTRO-ANEDOTA

“Quando um político é o tema de uma anedota colectiva, isso significa que perdeu a legitimidade” é o subtítulo do editorial de hoje do “Público”. Trata-se da situação actual de Miguel Relvas, cuja contribuição para ao anedotário nacional vai ficar na história do séc. XXI. Aos poucos vai-se sabendo que, ao longo da sua vida ele se foi colocando a jeito para o que agora lhe está a acontecer e é impossível que o primeiro-ministro não estivesse informado sobre o carácter da personagem que escolheu para seu braço-direito. O não-dr. Relvas passou a não-ministro Relvas. A partir de agora, tudo o que ele possa dizer, ainda que seja da maior relevância para o país deixou de ser ouvido, e de ser levado a sério pelo comum dos portugueses. A sua não-exclusão do Governo só vai desgastando o Executivo e, de um modo particular a imagem de Passos Coelho que não se sai nada bem da cobertura que lhe vai dando.

Há, contudo, um aspecto positivo para o Governo no manancial de anedotas relvísticas que por ai proliferam – na blogosfera e não só – os portugueses vão estando distraídos em relação ao continuado agravamento das suas condições de vida.

Com a aproximação da altura do ano tendencialmente escassa em termos de notícias de relevo, a continuação em jogo do caso Relvas constitui um maná para jornalistas e humoristas. O tema garante sempre um interessante artigo de opinião ou uma bela rábula para Ricardo Araújo Pereira.

Insere-se nesta ideia o artigo que a seguir transcrevemos do “Diário de Coimbra” de hoje.


Sim, Senhor Ministro

Sim, Senhor Ministro! Este é o título de uma série televisiva inglesa, cómica, exibida na década de 80. Nela se retrata a vida política britânica, com sagacidade e humor.

A série inicia-se com a festa da vitória do partido político, que ganha as eleições e forma um novo governo.

Vem isto a propósito da política portuguesa e, em particular, do(s) caso(s) Miguel Relvas. No último ano, em todas as semanas, Miguel Relvas foi notícia. Começou com a ascensão do Dr. Pedro Passos Coelho a líder do PSD. Ainda Relvas não era Ministro, já o consideravam número dois do futuro Primeiro-Ministro.

Coma nomeação do Primeiro-Ministro, como previsto, Miguel Relvas chega a Ministro, sendo semanalmente apontado, como fundamental, na coordenação política do Governo. “Sim, o Senhor Ministro.”

Sob a alçada do seu Ministério criaram-se grupos de trabalho para tudo e mais alguma coisa. Como é sabido, muitos grupos de trabalho significam muitas pessoas especializadas, ou seja, muitos Drs. Estes quando reuniam com Miguel Relvas e lhes era solicitado o máximo empenho, respondiam invariavelmente: “Sim Senhor Ministro!”

Mais recentemente, ficámos a saber que o Senhor Ministro afirmou na Assembleia da República não conhecer o Dr. Silva Carvalho – espião que se queixa de ser expiado pelos jornais – quando, afinal, se apurou que o conhecia. Conhecia, “Sim, Senhor Ministro!”.

Da espionagem à pressão sobre os jornalistas foi um “biquinho”. Contudo, a Entidade Reguladora da Comunicação Social, rapidamente, elaborou um relatório e, o Dr. Carlos Magno anunciou que o Senhor Ministro foi “ilibado”. Sim, Senhor Ministro!

Nos últimos dias, não existe televisão, jornal, correligionário, humorista ou até vizinho que não fale da licenciatura de Miguel Relvas (invariavelmente iniciam a conversa referindo-se ao senhor Ministro, como “o Relvas”, ou apenas o Senhor Ministro). Mas vendo bem, falam do Senhor Ministro, Miguel Relvas, como sempre falaram. Apenas Ministro. Só Miguel. Por vezes, o “Relvas”.

Até o Primeiro-Ministro, Dr. Passos Coelho, declarou solenemente, que a licenciatura de Miguel Relvas se tratava de um “não-assunto”.

Ora, no meio de assuntos com importância tão relativa, – não dizer a verdade na Assembleia da República ou o desrespeito pela liberdade de imprensa – não me recordo de alguma vez tratarem o Senhor Ministro por Senhor Dr., título, a que tem direito.

E perdoem-me a franqueza, isso é que é verdadeiramente importante. Pelo menos, para Miguel Relvas. Não. Para o Senhor Dr. Miguel Relvas. (Luís Filipe Pereira, advogado)

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