domingo, 8 de julho de 2012

A SEGUIR VÊM AS REGUADAS?

O sistema de crime e castigo que constitui o novo Estatuto do Aluno é (mais) uma aberração deste Governo, pela mão do ministro Nuno Crato. Este senhor desconhece completamente a realidade social portuguesa e pensa que todos os problemas de insucesso escolar, falta de assiduidade e indisciplina se resolvem à bruta. Primeiro foi a introdução dos exames para, supostamente, melhorar o aproveitamento escolar, agora vêm as multas e outras penalizações às famílias dos alunos com problemas disciplinares e de assiduidade às aulas. Deixemos passar algum tempo para verificarmos os efeitos desta medidas… Se não resultarem o que se vai fazer a seguir? Voltar às reguadas?

O psiquiatra José Gameiro explica na sua crónica na “Revista” do “Expresso” (7/7) por que razão não concorda com o novo Estatuto do Aluno.

POLÍCIA DAS FAMÍLIAS

(...) O novo Estatuto do Aluno proposto pelo Governo é mais uma intrusão abusiva e repressiva nas famílias de quem pensa que os problemas de indisciplina, aproveitamento e assiduidade se resolvem com multas, retiradas de apoios sociais e tratamentos psicológicos compulsivos. O ministro Crato pode perceber muito de matemática, mas não percebe nada de pessoas e de famílias.

Penalizar famílias que saem de casa às 5 da manhã para ir trabalhar e que deixam os filhos com a responsabilidade de se levantarem para ir à escola não é exatamente o mesmo que responsabilizar pais que levam os filhos à escola de carro e que se atrasam sistematicamente porque a higiene pessoal mete mais cremes.

As famílias que têm apoios sociais são também aquelas que não têm a quem deixar os filhos pequenos, moram longe do trabalho e não têm empregadas para cuidar dos filhos quando estão doentes, eles ficam com os irmãos mais velhos, porque se as pessoas faltarem ao trabalho são despedidas.

São as que, muitas vezes, não podem ir a reuniões na escola em horário laboral não por ser uma chatice sair do gabinete da empresa mas porque são ameaçadas de retaliação se o fizerem.

Mas a medida mais grave e de legalidade duvidosa é uma espécie de tratamento compulsivo que é exigido aos alunos problemáticos.

Sabemos como a excessiva psicologização dos problemas de insucesso escolar levou a um excesso de diagnósticos e a uma desresponsabilização das escolas, com múltiplos envios de jovens para os psiquiatras e psicólogos, com medicações precoces para hiperatividade e défices de atenção, que se tornaram numa verdadeira epidemia.

Agora querem-se impor às famílias coimas e participações às comissões de proteção de menores se não frequentarem as consultas prescritas.

Senhor ministro, as famílias não são todas iguais, são aliás cada vez mais diferentes, mas têm competências parentais e emocionais que não são obrigatoriamente coincidentes com o modelo familiar tradicional.

Há pais que saem de madrugada e chegam à noite para sustentar a família, há muitas mães sozinhas a trabalhar a 3 euros/hora, em que os filhos mais velhos tratam dos mais novos e que nem sempre conseguem cumprir as obrigações escolares.

Seguramente também há famílias insensíveis à necessidade de educar os filhos e que têm de ser responsabilizadas para o fazer.

Mas, se estas medidas não resultarem, o que vai fazer a seguir: mandar prender os pais e internar os filhos?...

Desculpe-me o conselho, perca uns dias do seu precioso tempo, saia do ministério e fale, sem pressa e sem comunicação social, com pais, professores e jovens antes de tentar transformar a educação num sistema de crime e castigo.

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