domingo, 2 de dezembro de 2012

OE 2013, O GOLPE FINAL?


Sendo certo que nem o mais irracional dos animais repete uma acção cujas consequências negativas conhece, não podemos imaginar que o nosso Governo proponha, de forma precipitada, um orçamento que reforça para pior os malefícios do anterior. O fanatismo ideológico faz parte dos genes desta gente mas a burrice nem tanto. O Orçamento do Estado de 2013 (OE) é o culminar, talvez o golpe final na estratégia de destruição do Estado social que tem sido, apesar das suas contradições um bom instrumento no combate às desigualdades sociais. O que causa alguma perplexidade nesta estratégia da coligação de direita é que, os seus resultados vão ser catastróficos para a classe média, a principal base de apoio de PSD e CDS.

E não vale a pena continuar a repetir-se até à exaustão que não há alternativas a estas políticas porque é uma falácia. Sobre este tema, vale a pena ler o texto, muito equilibrado, de Daniel Oliveira que o Expresso de ontem publica.

O OUTRO AUMENTO DE IMPOSTOS

Até o mais irracional dos animais descobre que uma mesma ação nas mesmas circunstâncias resulta nas mesmas consequências. Este orçamento, reforçando os erros do anterior, terá os mesmos efeitos. Esses efeitos atuam nos indicadores económicos e alteram as previsões em que o orçamento se baseia. Uma mecânica que continua a surpreender o primeiro-ministro. Fazendo o mesmo que se fez este orçamento não será cumprido. Passos sabe, Gaspar sabe, a troika sabe, toda a gente sabe. Porque insiste o governo? Porque espera, perante a situação dramática em que estaremos daqui a uns meses, encontrar o ambiente político e social favorável para a tão famosa “refundação do Estado”. Se não se vai lá pela receita, vai-se pela despesa. É a “missão histórica” de Passos Coelho.

A refundação das funções sociais do Estado parte de uma falácia argumentativa: se cortarmos na despesa as famílias terão mais dinheiro disponível e a economia crescerá. Como o primeiro-ministro explicou na sua entrevista à TVI, um quinto das despesas são em salários. Cortar aqui é cortar nos rendimentos. Nos seus efeitos, é o mesmo que aumentar impostos. Metade são prestações sociais. E não é possível fazer cortes sérios na despesa primária sem cortar aqui. Acontece que só as despesas em saúde e educação, se fossem pagas pelos cidadãos a preço de mercado, corresponderiam a 27% dos seus rendimentos. Ou seja, se o Estado não garantisse saúde e escola gratuitas, isso corresponderia a um aumento das despesas das famílias muitíssimo superior a qualquer aumento da carga fiscal até agora anunciado. Com uma diferença: não seria progressivo. Quase não se sentiria nos mais ricos e seria incomportável para a classe média. Apesar do aumento das disparidades salariais, a desigualdade diminuiu em Portugal. Graças, diz a OCDE, ao rendimento alargado proporcionado por serviços públicos universais. E cada português paga, por via dos impostos, metade da média da zona euro em despesas sociais. Um Estado social insipiente tem sido o mais poderoso instrumento contra o maior problema do país: a desigualdade. Sabendo-se que os mais pobres nunca poderão pagar a escola pública e o SNS, e por isso terão de ficar fora desta equação, está encontrada a principal vítima desta engenharia social: a classe média, que empobreceria a uma velocidade supersónica. A destruição da classe média que tal imposição implicaria, transformaria Portugal, na feliz expressão do economista Alexandre Abreu, num país “em vias de subdesenvolvimento”.

Há alternativas. Elas passam por cortes que não tenham efeitos recessivos e num aumento da receita fiscal sem ser por via do aumento dos impostos. Tirando algumas despesas menos relevantes (PPP e custos intermédios), só sobra uma rubrica pesada onde cortar: os 9% da despesa (4,5% do PIB) que gastamos em juros da dívida. Têm de ser renegociados. O aumento da receita fiscal passa por o caminho inverso ao que tem sido seguido, promovendo o crescimento económico. Só assim podemos garantir a sustentabilidade das contas públicas. Não podemos fugir disto: só com mais rendimentos para os cidadãos e para as empresas e consequente revitalização da economia conseguiremos pagar as nossas dívidas e o Estado social. Tudo o resto, é empurrar os problemas com a barriga.

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