quarta-feira, 6 de março de 2013

NÃO HÁ FALTA DE DINHEIRO


Durante o debate quinzenal de hoje, no Parlamento, afirmava o Primeiro-Ministro que “o país não tem dinheiro para estimular a economia” de forma a gerar a criação de empregos. O artigo que Rui Tavares assina hoje no Público veio na melhor altura para questionar esta afirmação de Passos Coelho. Não há como lê-lo e reflectir sobre o que lá vem escrito.


Onde está o dinheiro?

De cada vez que um progressista defende políticas de investimento, apoio ao emprego ou expansão dos direitos e do Estado social, há sempre a resposta inevitável, que é uma pergunta: mas onde está o dinheiro? Não há dinheiro!

Será verdade?

Vejamos alguns números. O branqueamento de capitais na União Europeia - que pode ser desde reciclagem de lucros do tráfico de drogas ou armas até à evasão fiscal ilegal ou semilegal - vale entre 2% a 2,5% do PIB europeu. Em impostos não recebidos, os Estados-membros da União perdem um bilião de euros. Bilião com "b" - um milhão de milhões. Por ano.

Para comparação, o plano orçamental da União é de 900 mil milhões - para os próximos sete anos. Abaixo, portanto, dos impostos fugidos num só ano. O que perdemos em evasão e sonegação fiscal chegaria para fazer dez planos de crescimento e emprego iguais ao apresentado pelo Presidente Hollande - que ainda não está financiado.

E em Portugal? Calcula-se que, no ano de 2010, Portugal tenha perdido cerca de 12 mil milhões em impostos não arrecadados. Vejamos: o nosso défice nesse ano foi cerca de 15 mil milhões. Os impostos perdidos cobririam 80% do nosso défice, ou mais de 60% dos nossos gastos em saúde, que é um dos itens mais caros do nosso Orçamento. Se tivéssemos arrecadado esse dinheiro, daria para pagar toda a nossa dívida - tal como estava - em apenas 13 anos.

A falta desse dinheiro mantém-nos pobres e rouba-nos o futuro.

Claro, desde que a crise começou, estes números pioraram: graças à senhora troika, a nossa dívida saltou para o dobro; a nossa economia paralela, que já valia metade da despesa pública, não terá parado de aumentar.

Como se pára isto? Uma coisa é certa: não é com a fatura do café e do pastel de nata. A evasão fiscal, sistemática, estruturada, sofisticada, não é fácil nem barata. Precisa de uma rede de empresas fictícias, advogados, contabilistas, contas bancárias em múltiplas jurisdições. A grande evasão - lá onde está o dinheiro - está nos grandes negócios. Legais e ilegais.

As jurisdições, buracos na lei e zonas de sombra utilizada pelas máfias feias, porcas e más são as mesmas a que os bancos mais respeitáveis (se é que os há), os maiores escritórios de advogados e os contabilistas mais astutos lançam mão para fazer o "planeamento fiscal agressivo" dos seus clientes. O dinheiro de ambos anda nos mesmos carrosséis de IVA, nas mesmas companhias fictícias e faturas falsas.

Para acabar com isto é preciso saber o que fazem os bancos europeus, mesmo nas suas filiais fora da União - usando para isso o novo mecanismo único de supervisão. É preciso criar um registo europeu de acionistas legais de empresas, para acabar com a vantagem de as usar como bonecas russas. É preciso criar um registo legal com o "beneficiário último" dos ativos em banca, sempre uma pessoa individual, e fazer disso uma diligência obrigatória dos bancos, reforçada no caso de "pessoas politicamente expostas" (ditadores, acusados de corrupção e outros). É preciso responsabilizar legal e criminalmente os administradores de empresas, incluindo os testas-de-ferro, por ação ou omissão na lavagem de dinheiro. E é preciso criar uma unidade europeia de investigação em crime económico. Há dinheiro e há maneira de o encontrar.

O que falta é vontade política para ter o nosso dinheiro de volta e recuperar o futuro.

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