sexta-feira, 28 de junho de 2013

CAVACO IGUAL A CAVACO



Cavaco Silva é, actualmente, o político em actividade há mais anos em Portugal. Nunca revelou grande apego nem entusiasmo pela democracia e, quer como Primeiro-Ministro quer como Presidente da República (PR), já deu provas suficientes de que “para ele, as bases da democracia não são muito diferentes do código de estrada. Cumprem-se mas sem paixão”. Os dois casos recentes que o provam têm a ver com o que se passou com o jornalista Sousa Tavares e com o cidadão que mandou o PR trabalhar. Quer num caso quer noutro, o prof. Cavaco, como qualquer outra pessoa que ocupasse o cargo que ele ocupa, teria uma manifestação de superioridade, ignorando os impropérios, aliás, bem menos contundentes do que outros, que, frequentemente, se ouvem na televisão, dirigidos a personalidades que ocupam cargos de relevo, por esse mundo fora. Mas, da parte do prof. Cavaco é esta a reacção mais espectável, para variar…

A propósito, transcrevemos a seguir um interessante texto sobre este tema, recolhido do Diário de Coimbra do passado dia 23 de Junho.

 

E se Cavaco fosse árbitro de futebol!

Não sou adepto do insulto, mas também não sou hipócrita, ao ponto de me considerar imaculadamente impoluto, na matéria. Esporadicamente, também mando a bola à trave, com algum arrependimento.

Mas fico preocupado com o caminho que as coisas estão a tomar. Um jornalista, na qualidade de entrevistado, chamou “palhaço” ao Presidente da República e, honradamente, assumiu essa responsabilidade. Falo de Miguel Sousa Tavares que tem meios e capacidades suficientes para se defender, se o caso chegar a julgamento.

Um outro cidadão mandou a mesma excelsa pessoa trabalhar. Também isto foi considerado um insulto e, em julgamento sumário, o atrevimento foi sancionado com uma multa superior a mil euros.

São dois sintomas da doença que abala a democracia. Não é que eu encontre virtudes democráticas no insulto. É evidente que não. Mas que quem exerce o poder político, em democracia, tem obrigação de saber ouvir o que lhe dizem e, sobretudo, saber traduzir o aparente enxovalho, em crítica política. Seria uma manifestação de superioridade, perante a vulgaridade do impropério.

Cavaco silva não tem capacidade de entender isto, porque, para ele, as bases da democracia não são muito diferentes do código da estrada. Cumprem-se mas sem paixão. Que vida difícil teria Cavaco, se acaso fosse árbitro de futebol.

Todos os dias, na rádio e televisão, vejo e ouço portugueses que se dizem roubados, pela política fiscal. Um roubo presume invariavelmente a existência de um ladrão que, neste caso, só pode ser o Governo. Será que vão ser todos processados, pelo executivo?

Comparemos isto com o que se tem passado, mundo fora, por estes dias. Na Turquia, Grécia, Brasil e Espanha, entre muitos outros exemplos, as sociedades lutam contra o poder político. Em Portugal, a sociedade queixa-se. E, do meio da lamúria, soltam-se desabafos mais pesados, que o presidente da República não tolera.

Vejo, na televisão turca, um cidadão jovem, de cara destapada, chamar “cornudo” ao Primeiro-Ministro. Não consta que Tayyip Erdogan o tenha processado. Na televisão brasileira, um manifestante desembrulha para a multidão uma lista enorme de políticos corruptos e nenhum deles, que eu saiba, se queixou aos tribunais.

Noutra área, o músico Jean-Michel Jarre disse que Durão “Barroso precisava levar umas palmadas no rabo”. Nem disse exactamente “rabo”, mas foi incisivo. Jarre tem toda a razão para criticar Barroso que exorbitou os limites da sua função e manifestou uma profunda ignorância sobre a matéria em discussão. Considerou que a França, ao impedir a inclusão do audiovisual no Acordo de Livre Comércio com os Estados Unidos, estava a assumir uma atitude “reaccionária”.

Em causa está, sobretudo, a entrada livre do cinema americano, nos circuitos europeus, com volumes de exibição que já hoje são superiores a 90 por cento. A França é um dos estados europeus que mais investe no cinema nacional e não só – tem co-financiado muitas obras de Manoel Oliveira, por exemplo. Além disso tem feito um esforço meritório, junto dos grandes estúdios de Hollywood, para participarem em co-produtoras europeias. É evidente que, a partir do momento em que o cinema americano entrasse na Europa, livre de taxas, este esforço francês seria de imediato mal-sucedido.

E Jean-Michel Jarre tem autoridade moral para falar. Ele é filho de Maurice Jarre, falecido em 2009. O pai viveu décadas em Hollywood, onde trabalhou no cinema, como um dos mais criativos produtores e autores de bandas sonoras, para cinema. Supondo que Jean-Michel seja o herdeiro dos direitos de autor do pai e que, ainda hoje, por certo, receba apreciáveis dividendos, do cinema americano. Apesar disso, teve a hombridade de se colocar do lado justo. Não me parece que Durão Barroso vá tirar desforra na justiça.

Nos últimos dias, também li e ouvi ataques a Mário Nogueira que podem ser considerados insultos e enxovalhos. Para mim, não foram mais que a prova do sucesso da greve dos professores. Não vale a pena atribuir-lhes qualquer outro significado.  
 

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