domingo, 12 de janeiro de 2014

O RANCOR DO GOVERNO AO ESTADO



Há realidades que são óbvias pois só não as vê quem não quer ver. Uma das que salta à vista desde que a maioria de direita chegou ao poder é que este Governo tudo fará para destruir tudo o que “cheire a Estado”, particularmente, “as funções sociais e empresariais do Estado”. Esta constatação é comentada no “Expresso” Economia de ontem em termos muito fortes por alguém insuspeito de “esquerdismo”, o que lhe dá uma credibilidade suplementar perante a opinião pública. De qualquer maneira, o texto assinado por Nicolau Santos, com uma ponta de ironia, merece a concordância de qualquer bloquista.
Este Governo odeia o Estado, em particular as funções sociais e empresariais do Estado. Para este Governo, os reformados são um estorvo, os desempregados uns inúteis, os que recebem o Rendimento Social de Inserção uns parasitas, os que metem baixa e recorrem ao Serviço Nacional de Saúde uns malandros e as empresas públicas são apenas um sorvedouro dos dinheiros do Estado. Os reformados podiam morrer, os desempregados podiam emigrar, os doentes deviam trabalhar, as empresas públicas deviam fechar (as que dão prejuízo) ou ser vendidas a privados (as que dão lucro). Basicamente, é isto que pensa o primeiro-ministro, uma Thatcher serôdia e de calças que nos saiu em sorte trinta anos depois do modelo original – e que, como a Dama de Ferro, ambiciona não apenas mudar o Estado e a economia, mas sobretudo mudar-nos a alma.
Os exemplos que confirmam isto são múltiplos. Desde que tomou posse mais de metade das pessoas que recebiam o Rendimento Social de Inserção ficaram sem ele, os abonos de família caíram em flecha, a duração e os valores do subsídio de desemprego encurtaram vertiginosamente, os salários dos funcionários públicos já recuaram mais de 20% e as reformas e pensões têm sofrido cortes sobre cortes.
Mas o Governo também despreza os interesses empresariais do Estado. A prová-lo está a sobranceria com que deixou a Parpública, empresa gestora das participações do Estado, durante Seia meses sem presidente, ou o Metro de Lisboa exatamente na mesma situação, apesar das sucessivas greves dos trabalhadores devido à incapacidade da administração em funções para fechar um acordo laboral para 2014.
No caso da Parpública, o Governo já acordou com a troika o seu encerramento em 2014, o que quer dizer que pretende acabar com todas e quaisquer participações do Estado – ou, pelo menos, com a sua gestão de uma forma minimamente coerente. Mas, entretanto, lá indicou um nome para presidir á empresa,, que foi ratificado pela Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública, dado tratar-se de uma pessoa com ”uma experiencia efetiva na gestão de topo de situações de elevada complexidade” e que demonstra um “conhecimento da problemática em causa”.
Pelo seu currículo, tudo indica que Pedro Ferreira Pinto domina perfeitamente a “problemática”. É desde Outubro de 2011 administrador de uma empresa de aluguer de purificadores de água, o que o recomenda fortemente para o lugar. Foi administrador da Selecta, um fundo de investimento imobiliário fechado, e da Lisbon Brokers, uma corretora já desaparecida que foi investigada pela CMVM por utilização de informação privilegiada. Esteve ainda na ASK, uma empresa de serviços de assessoria financeira, tendo como colega Nuno Fernandes Tomaz, atual administrador da CGD e militante do CDS. E talvez fosse bom o dr. João Bilhim ter verificado se por acaso não existe qualquer queixa-crime contra o senhor na Procuradoria Geral da República.
Ora quando se nomeia para presidir à Parpública alguém que nunca teve nada a ver com o Estado nem com a defesa do interesse público, de duas uma: ou Pedro Ferreira Pinto estava farto de alugar purificadores de água numa empresa mundialmente conhecida ou o Governo já só encontra pessoas com este notável curriculum para gerir uma coisa tão pouco importante como são as participações do Estado.
Em qualquer caso, chama-se a isto tratar os interesses do Estado a pontapé. E nisso o Governo é exímio.

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