terça-feira, 6 de outubro de 2015

DIREITA EM QUEDA NO PARLAMENTO


Concluído o processo eleitoral, começam a cair na comunicação social as análises aos resultados. Desta vez há muito que comentar porque a Assembleia da República (AR) sofreu forte renovação com quase metade de novos deputados para além da alteração numérica de todos os grupos parlamentares.
É opinião generalizada dos analistas políticos de todos os quadrantes que o principal vencedor destas eleições foi o Bloco de Esquerda, tão evidentes são os valores apresentados – os melhores resultados de sempre do Bloco. Não há que fugir das evidências ainda que com grande dor de cotovelo de muitas personalidades e organizações políticas.
A coligação de direita fez um grande alarido com a vitória nas eleições – teve mais votos que qualquer outro partido/coligação – mas pouco mais tem a festejar já que perdeu mais de 700 mil votos e de duas dezenas de deputados. Desde logo, para ver aprovado o seu programa de Governo e Orçamento de Estado para 2016 necessita dos votos da esquerda light, leia-se PS.  
Numa análise simples mas correcta, o jornalista José Vitor Malheiros (*) toca nos pontos principais das conclusões que se devem tirar dos resultados eleitorais, como se pode ler a seguir.
A coligação de direita PaF ganhou as eleições. Contra toda a razoabilidade, mas como as sondagens previam. Ganhou as eleições, mas perdeu. Perdeu a maioria absoluta. Perdeu cerca de 12 pontos percentuais. Perdeu mais de 730.000 votos. Perdeu 22 ou 23 deputados.
Se olharmos para estas perdas, a leitura é evidente, independentemente dos gostos políticos. Há menos pessoas hoje a querer um governo da direita do que havia em 2011. Um número muito elevado de portugueses que votaram PSD ou CDS em 2011 (um em cada quatro), fugiu agora do voto à direita, o que significa uma condenação da governação do PSD-CDS e uma condenação das políticas de austeridade. A base de apoio da direita encolheu.
O PS perdeu as eleições. Perdeu porque não ultrapassou o PaF. Perdeu porque fez um programa de direita light, sem alma, sem convicção, sem visão e sem coragem. Perdeu, mas ganhou. Ganhou mais de quatro pontos percentuais. Ganhou mais de 180.000 votantes. Ganhou 13 ou 14 deputados. A base de apoio do PS cresceu. Quanto a António Costa, perdeu sem ganhar nada. Perdeu porque não conseguiu melhor, em termos numéricos, que a vitória poucochinha de António José Seguro nas europeias - que, foi, apesar de tudo, uma vitória.
Mas é claro que estes números não dizem tudo por si só. A coligação PSD-CDS ganhou porque continua a ser a formação partidária com mais votos. O PS perdeu porque não conseguiu ultrapassar o PaF e perdeu porque nem sequer captou todos os votantes que abandonaram o PSD-CDS. Ou, se os captou pela direita, perdeu a maioria deles pela esquerda.
O Bloco de Esquerda ganhou. Foi o único que ganhou mesmo. Quase duplicou a sua votação em número de votos (288.206 para 549.153) e em percentagem (5,19% para 10,22%) e obteve um recorde em número de deputados: 19 em vez dos 8 que tinha e mais que os 16 que eram a sua marca máxima.
A CDU também ganhou. Ganhou porque aumentou a sua percentagem de votantes (7,94% para 8,27%). Ganhou porque conquistou 3.400 novos votantes. Ganhou mas perdeu. Perdeu porque foi ultrapassado pelo BE. Perdeu porque, dos mais de 260.000 votantes que se deslocaram nesta eleição para a esquerda do espectro parlamentar, apenas captou aqueles escassos 3.400.
O CDS ganhou. Ganhou porque faz parte do PaF, que ganhou. Mas como o PaF nem sequer conseguiu o mesmo número de votos que o PSD sozinho nas últimas eleições (teve menos uns 167.000), fica a suspeita de que o CDS possa ter perdido. Talvez tenha até desaparecido.
O PAN ganhou porque elegeu um deputado. O Livre/Tempo de Avançar perdeu porque não elegeu nenhum.
A direita ganhou porque o partido/coligação mais votado é de direita e porque vai formar governo. Mas perdeu porque os cidadãos deram à esquerda quase o dobro de votos que deram à direita e porque o governo de direita viverá numa instabilidade constante devido à falta de apoio parlamentar.
A esquerda ganhou porque teve quase duas vezes mais votos que a direita. Mas perdeu porque não se consegue entender para formar governo, nem sequer para concretizar uma actividade legislativa consequente.
A direita ganhou porque a esquerda não a irá derrubar com medo de que o PSD e o CDS se vitimizem e consigam uma maioria absoluta em eleições antecipadas. A esquerda ganhou porque vai ter o governo a comer da sua mão no Parlamento.
(*) Público

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