quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O COMPLEMENTO SALARIAL ANUAL PARA PROMOVER A DIGNIDADE DE QUEM TRABALHA


Está dito e redito que há cada vez mais gente que, embora tendo trabalho não consegue sair da situação de pobreza. O aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN), ainda que para valores modestos, “é oportuno” tendo em atenção que actualmente 20% dos trabalhadores independentes aufere o SMN, na sequência da quebra salarial imposta pelas políticas levadas a cabo pelo governo Passos/Portas. Isto significa que o aumento do SMN, por si só, não vai retirar muita gente da situação de pobreza e a promoção de “maior justiça social ao nível salarial e fiscal” é essencial para o desenvolvimento de uma politica com efeitos redistributivos. Daí a necessidade da criação de uma nova prestação social anual, o “complemento salarial anual”, para os trabalhadores que auferem rendimentos muito baixos, como refere a Professora Universitária e Investigadora, Glória Rebelo no seguinte artigo de opinião que transcrevemos do Público de hoje e que vale a pena ler com atenção.
O aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) é oportuno e responde a um problema social premente em Portugal. Historicamente o SMN é uma prestação de referência crucial, instituída para satisfazer as necessidades básicas pessoais e familiares do trabalhador e envolve, por isso, uma conotação de suficiência que implica um mínimo (irredutível) de subsistência familiar.
Em Portugal, nos últimos 4 anos, não só por via da destruição do emprego mas também pelo aumento da precariedade e do número de trabalhadores pobres, a verdade é que se assistiu a um empobrecimento de muitas famílias. O emprego criado, sobretudo precário – isto é a termo e, muitas vezes, simultaneamente, a tempo parcial (involuntário) – vem sendo remunerado com salários cada vez mais baixos. E, em 2014, a percentagem de trabalhadores por conta de outrem a auferir o SMN subiu mais de 7 pontos percentuais em relação a 2013, atingindo os 20%, ou seja, um em cada cinco trabalhadores dependentes aufere o SMN. Por outro lado, a pobreza junto da população empregada (por conta de outrem) aumentou para 11% em 2014, em grande parte junto das famílias monoparentais ou as famílias com três ou mais filhos.   
Ora, quando no nosso país se discutem os graves problemas da baixa natalidade ou da emigração, sabendo-se que há cada vez mais famílias em que cada membro do casal aufere o SMN, o aumento destes salários em 2016 pode ter um impacto significativo nestes agregados.  
E, uma vez que é fundamental voltar a apostar no capital humano, são também necessárias políticas públicas que promovam maior justiça social ao nível salarial e fiscal e respondam ao problema dos trabalhadores pobres. Ou seja, políticas com efeitos redistributivos, alicerçadas quer numa perspetiva de trabalho digno quer numa política de rendimentos que acompanhe a evolução da nossa economia.
Daí que a criação de uma nova prestação, o “complemento salarial anual”, que visa proteger o rendimento dos trabalhadores que em virtude de baixos salários e de uma elevada rotação do emprego, ao longo do ano não auferem rendimentos que os coloquem acima da linha da pobreza, possa vir a representar uma importante resposta para reduzir efetivamente o número de trabalhadores em situação de risco de pobreza. Este complemento salarial, que constitui um crédito fiscal (“imposto negativo”), apurado em função do rendimento e da composição do agregado familiar, constituirá um importante mecanismo adicional de combate à pobreza.  
Em Portugal, o desafio de reduzir a pobreza junto dos trabalhadores será, para além de uma questão de justiça social, um objectivo estratégico para um modelo de desenvolvimento nacional, atendendo a que a dignidade social das pessoas é um princípio central para uma sociedade decente.  

Sem comentários:

Enviar um comentário